segunda-feira, 16 de novembro de 2015

ÀS VEZES É PRECISO FALAR DE AMOR - Roberval Paulo

Houve uma era em que mais se sentia o amor. E nesse tempo, um  homem que viveu além de tudo e de todas as coisas possíveis e impossíveis, dizia: Amai-vos uns aos outros como eu vos amo. E disse mais: Amai ao próximo como a ti mesmo. Mas, plantar o amor é difícil; colher, muito mais difícil se faz. Ele foi perseguido, acusado, julgado e condenado e, foi morto. Seu pecado? – Falar e viver o amor.

A vida se fez diferente a partir daí. Com o seu amor infinito, libertou e salvou todas as gerações passadas, contemporâneas e futuras pelo seu sacrifício e sofrimento aos pés do calvário, sob o peso do lenho da cruz e pelo seu sangue, que alimenta todos os nossos dias. O mundo se dividiu entre antes e depois dele. A vida triunfou e venceu a morte e a fonte de água viva jorrou no seio da humanidade.

Hoje, depois de tanto tempo e situando-me dentro da realidade atual, pergunto a mim, sem poder livrar-me de uma estranha sensação de descontentamento e impotência: Nada valeu a pena? Será que tudo foi em vão? Recorro ao poeta, que em um tempo mais recente, dizia: “Tudo vale a pena se a alma não é pequena.” E assim, busco alcançar um entendimento que possa, pela força desse mesmo amor que é dele e que habita em mim, salvar-me e libertar-me das garras sangrentas  do egoísmo e da ambição que, pela inconteste e maléfica influência do desejo negro do ter, instalou-se em nós e nos impede de abrir as portas para as virtudes do ser. O mundo já não canta o amor e a história continua a se fazer com sangue. No ciclo vicioso do poder, a ambição gera seus filhos, verdadeiros pais do egoísmo. A destruição é total e se demorarmos a acordar desse sono e sonho malditos, o caminho é sem volta. A natureza, agonizando, pede socorro, sem ser ouvida. Os valores éticos e morais foram-se, partiram para uma galáxia distante, expulsos pela nossa soberba e cobiça e pelo nosso desprezo e desrespeito ao semelhante. Só se vê descaso pelas questões sociais que afligem o planeta e aniquila milhões de semelhantes, transformando-os em bichos à procura do nada, abatidos todos os dias pelo tiro certeiro do inevitável, agindo fora do seu ciclo natural. A sociedade perece, vítima do seu próprio desamor e leva consigo a inocência que um dia foi nossa e que reinava nos recôncavos perdidos e esquecidos do limiar da existência. O caos é total e parece não ter fim. Tornar-se-a eterno como eterno foi um dia, o amor, que dorme, enfraquecido e desqualificado, no seio desumano dos humanos que somos.

É preciso acordar. O sinal de alerta já foi acionado e a luz das trevas só espera o momento para reinar sozinha, negra e sem cor e desesperançada de viver.  A vida, agora, ínfima e tênue, continua a descendente escalada e, teimosa e obstinada que é, procura perenemente e incessantemente pelo amor, para ressuscita-lo.  Procura incansável mas necessária. Só esta é capaz de alterar esta realidade; vida e amor andando juntos.



Assim, penso e ainda me sinto existir e volto a crer, depois de tantas incertezas, que a humanidade tem jeito. Mas, depende de nós, de todos nós. Vamos dar essa mãozinha. Vamos, todos nós, juntos, ressuscitar o amor e semea-lo em nosso meio e seio. E aí, cheios e repletos do amor, vamos trilhar juntos o caminho da paz, da compreensão, da igualdade e da vida digna e justa a todos, indiscriminadamente. Só o amor de tudo é capaz e é, esse amor, o dom maior. Está no ser e o ser é o espírito e é tudo o que resta. O espírito que é amor; o amor que é espírito. É isso mesmo. Sendo assim, estamos recomeçando no caminho certo. É o que sempre digo. Às vezes é preciso falar de amor.

Roberval Paulo

Poesia: "O trovão de janeiro é quem espanta O fantasma da seca no sertão!", um mote glosado por Lenelson Piancó


O trovão de janeiro é quem espanta
O fantasma da seca no sertão!

Toda vez que o ano é de fartura
O feijão de arranca enfeita a "broca"
E um sapo faminto deixa a toca
Quando ver mariposa e tanajura
A lagarta mastiga a folha dura
De uma galha do pé de algodão
E a espiga no bico do cancão
Vai servir de café, almoço e janta
O trovão de janeiro é quem espanta
O fantasma da seca no sertão!

Quando surge no céu, um nevoeiro
Uma dona de casa apronta a lata
E uma lágrima guardada é quem hidrata
A pupila dos olhos do vaqueiro
Só precisa uma chuva no terreiro
Pra que um pé de maxixe rasgue o chão
No roçado, um caroço de feijão
Com três dias na cova se levanta
E o trovão de janeiro é quem espanta
O fantasma da seca no sertão!

Poema de Lenelson Piancó

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

DESCONHECIDO - Roberval Paulo

Quando parti para os dias
Nem sabia, da noite, os seus mistérios
Se ia, sem destino, ao vento
Contando, dia a dia, a história de minha vida

Assim, quase sem querer
Sem vontade de seguir em frente, só seguindo
Sem entender o badalar das horas, só indo
Ingressava eu no ritmo louco do tempo

E este, o tempo, passando sem parar
Sem olhar para trás, sem se importar, só a seguir
E eu me vi no tempo, era eu e ele, ali
Caminhando a estrada que só se caminha
Que só se caminha, sem saber onde vai dar

Pude perceber
Que a caminhada é pra se levar
Que as pedras são pra se tropeçar e enfim
Cair e se levantar é pra quem sabe onde quer ir
Que os caminhos tortuosos é pra quem sabe
                                      andar e quer chegar
Que a estrada colorida, florida e iluminada
                                      é pra quem veio do mar

Que o destino é pra seguir com o tempo
Sem conhecer, sem saber, sem se abater
Só a romper a larga distância do sonhar
Sorrir e chorar no desconhecido mundo
Sofrer e amar ao som do vento vagabundo
Cantar, entre flores e lágrimas, a nossa breve trajetória

De quem veio, sem saber de onde
E vive, sem saber a razão
E fala, quando ninguém responde
Mas segue, segue em frente
A buscar o que nem sabe se existe
Às vezes, alegre, outras vezes, um ser triste
Que cansado da jornada, só pensa em chegar

Aonde? Não sabe...
Por que? Desconhece...
Mas sabe que um breve fim o espera

Porque a história se faz no caminhar.

Roberval Paulo