terça-feira, 30 de maio de 2017

SONETO DA INTIMIDADE II - Roberval Paulo

O meu som tem a cor da tua pele
A minha voz só se cala no teu beijo
Olhando para o céu são os teus olhos que eu vejo
A esfinge de um amor que se revele

No evangelho da palavra que se vele
Da moça se emoldurou a canção
E do canto fez se um rio em oração
O prenúncio de um enigma, e me fere

Não se entende, não entendo esse tormento
Um sentimento que não quer se revelar
Mais que vive e viaja no pensamento

No intuito de juntos um dia estar
Dois seres só esperando o momento

Alma e corpo a este amor se entregar.

Roberval Paulo

DIÁLOGO DO CAMINHAR - “LUZ AMARGA” – Roberval Paulo

Caminhante 1: Vendo esta luz amarga
Luz da estrada que andamos
Me diz aí camarada
Como insistir na jornada?
Quando fazer a parada?
Quando nos realizamos?

Caminhante 2: Nós não nos realizamos
Vamos só a estradar
Cantando a canção da estrada
Sem saber onde vai dar

Caminhante 1: Então porque tanto lutamos?
Pra que tão longe avoar?

Caminhante 2: Nós não nos realizamos
Só lutamos, só lutamos...
É a verdade do vivo
Só se ir a caminhar.
Cantar quando a dor se ir
Chorar quando ela voltar
Sorrir na hora do sim
Isso quando o não deixar.

Caminhante 1: Sendo assim, me diz amigo
Quando se deve parar?
Como fazer com a estrada
Que não quer ir, quer voltar?

Caminhante 2: Não sei dizer as respostas
Das perguntas que me faz
Mas sei dizer que a vida
Não tem como andar pra trás.
Só pra frente é que se anda
Não tem como regressar
Nessa estrada que é só ida
Não há meios de voltar.

Caminhante 1: Me diz então como pode
A estrada continuar?
Se o caminho se fechou
Tá difícil de passar
Eu tento em frente seguir
Mas meu ser só quer voltar
Está cansado da luta
Aposentando a labuta
Desse vida diminuta
Quer cama pra descansar.

Descansar e não mais seguir
Nessa vida estacionar
Dar fim a todos os planos
Parar de vez, sepultar
Os sonhos que um dia eu tive
Que já parei de sonhar
Não quero a morte encontrar
Quero só saltar da vida
Antes que o trem da partida
Me parta no seu passar.

Quero está fora da vida
Quando o descanso chegar
Pela ponte que eu cruzar
Quero alcançar meu destino
Quero mais nem ser menino
Só o meu destino abraçar
Onde eu for a caminhar
Estradando o meu caminho
Que essa ponte seja enfim
O caminho da partida
Que o saltar fora da vida
Seja o meu libertar.

Caminhante 2: Eu não soube responder
Às perguntas que me fez
Mas vejo que se desfez
Das dúvidas que levantava
É que a vida está traçada
Cada um tem seu destino
É caminharmos com tino
Que saltaremos da vida
E que esse saltar nos seja
O encontro da redenção
Deus estende a sua mão
A todo que nele crê
Que o findar de todo ser
Seja o encontrar do perdão.


Roberval Paulo

ENCONTRO - Roberval Paulo

Eu ainda pensei em desistir
Quando as forças quiseram me deixar
E acuado e sofrido percebi
Que desistir era o fim antecipar
Era o fim chegando antes da hora
Era o fim sem existir o recomeço
Sei que a vida detém os seus tropeços
E o momento oportuno é agora
De lançar todos os meus medos fora
E a vida de frente enfrentar

Eu que quase não soube reagir
Quando os dias quiseram se findar
E o caminho que eu não queria ir
Se abria à minha frente feito o mar
Revirei minha história de mil horas
Refazer o caminho não tem preço
Renascer pela fé é um direito
É entender que existe um Deus lá fora
Que é vivo e presente, aqui e agora
E o seu sonho ele faz realizar

Nosso Deus anda solto por aí
Procurando sua casa de morar
Ele bate, não deixe ele partir
Abra a porta que ele vai entrar
Entrará na tua vida sem demora
Cuidará seu espírito com apreço
Sai ar sujo e entra o ar fresco
Nosso Deus em sua vida agora mora
Ceiará com você destino a fora
E sozinho jamais te deixará

Encontrei as razões pra prosseguir
Quando vi e senti Deus me abraçar
Ele disse, filho, vai, estou aqui
E eu fui andando devagar
Toda dor de mim se foi embora
Seu amor em mim eu reconheço
Se sua vida estiver do lado avesso
Creia e busque esse nosso Deus agora
Ele é sim e chegará em nova aurora

Esse Deus que é vivo e sabe amar.

Roberval Paulo

ESPERANÇA - Roberval Paulo

Tudo passa
Todos passam
A vida passa
E nós ficamos

Ficamos a esperar
Que a vida passe e nos leve
Que o sonho passe e carregue
A nossa esperança vã

Que dizem nunca morrer
Que dizem sim, vai chegar
E o vento chega e descansa
No sol da virgem manhã
A nossa desesperança

Mas ainda assim ela vive
A esperança imortal se faz
Nós somos tão pequeninos
Nós precisamos ser mais
Desesperar não é luz
Desesperar não é paz
Então vamos a esperar
A nossa desesperança
Outra vez se esperançar.


Roberval Paulo

segunda-feira, 29 de maio de 2017

LUA DOS AMANTES - (O novo quando vem) - Roberval Paulo

Uma cantiga de vento enrubesceu os amantes
E na moldura viajante dos olhos
A noite vinha lá do fim do mundo

A lua se escondia na brancura da nuvem
E na sonoridade da alma
Um silêncio se ouvia
Um silêncio de fazer cantar os mudos

O som do amor se encarnou por toda a luz
E todas as bocas disseram o provar de corpos em êxtase

Um uivo abafou a imensidão da distância
E o prazer aquiesceu a alma enamorada

Os desejos ardem, convulsões desenfreadas
Sensações que se revelam
Na rima solta do verso

O ar cansado desmaia
Num respirar lento e cortante
E a forma disforme se renova

No formatar novo do novo.

Roberval Paulo

INVOCAÇÃO - Roberval Paulo

Lampejos de um clarão azulado
Invoco teu semblante amigo
Assombra-me teu querer antigo
De no tempo ser somente amor
Desencontro-me deste teu fervor
Faça-me habitar a tua tenda
Que ao soneto não se dê emenda
E à sinfonia, faça transparente
Faça valer o império da semente
Na plantação do teu sublime amor

Clarão num céu incandescente
Vejo luz e que seja a luz da vida
Me revisita a mais doce cantiga
O meu ser já se refaz em calor
Afogueado por tão sutil ardor
Calor de um sol que acende a alma
Calor que o espírito acalma
E o coração mais duro enternece
Dia nos meus dias que amanhece
Orvalhando resquícios d’minha dor

Clarão que responde pela vida
Me diz o quanto mais devo amar
Como é a vida do lado de lá
Onde a paz se completa em louvor
Os anjos que só falam de amor
Quando mesmo irão me abraçar
O caminho que tenho a estradar
Quando é que me vem a tua mão
Em verdade e vida além razão

Eis- me aqui, sou teu servo Senhor!


Roberval Paulo

ANOITECER DE UM POETA - Roberval Paulo

Ainda não me disseram quem vinha pra me alegrar.
É que eu estava triste, uma tristeza tamanha
que eu quase que nem sabia o que é ser um ser feliz.

Mesmo com a ilusão de que aqui se caminha,
de que aqui se aninha e encontra a felicidade,
mesmo sabendo a cidade ser uma nossa aliada,
andando em suas calçadas de luzes e sons perdidos

De passos quase inauditos, de gritos roucos, de dor,
da noite em seu esplendor a acolher seus incautos,
da vida em passos largos, parando na encruzilhada,
na ponte que está cortada para não mais se emendar

Do ser que foi a voar por perder a caminhada,
da fonte doce e cansada correndo sem se abater,
do canto de um padecer mais solidão que tristeza,
mais prazer que aspereza na calda de um bentevi

Te vi ali, não aqui, resposta de um sabiá:
cantar bem eu sei, sou eu, que não me encontro é com a sorte,
só caminho é para o norte, um caminho conhecido,
não de mim, de um ser antigo que habitava outro mundo

E me disse – extra pra o mundo! – cheguei e aqui sou razão,
não me fale de emoção, isso já foi, é passado,
agora o tempo é fechado, não há lugar para a dor,
todo o horror que habitava o universo do ser,

hoje vai a entardecer o que amanhã for amor.

Roberval Paulo

PERDEMOS A BATALHA - Roberval Paulo

As famílias choram e as lágrimas e gritos se espalham e se perdem, sem ser ouvidos, na insensatez e insensibilidade desumanizada de uma sociedade sem norte.

A dor não cicatriza e se sente mais e mais a cada dia, sem alcançar o porque, a razão; o motivo do nascer sem cura.

O que era família já não mais se vê nem se sabe. Os valores se perderam no precipício do que um dia foi princípio...

A ética e a moral só um pouco ainda existem, bem pouco, e o egoísmo e a ambição, associados à individualização do ser, hoje falam por si só ou pelo seu grupo de iguais, agrupando-se pelas conveniências do lucrar mais em detrimento do que um dia foi a classe humilde, mais abastada, que, mesmo habitando o lado esquerdo da moeda, tinham o seu valor, pois a dignidade mantinha-se no exercício do seu auto e garantido sustentar.

Hoje não mais. O que foi família já não se vê. Os valores se foram na evolução imaterial, revertida na agregação e adição surtada da razão à emoção do material, que, se agiganta em importância nas relações que já foram de amor, transformadas hoje em mero comércio no objetivo seco e bruto do quem ganha mais.

O capital é a razão de ser da nossa inescrupulosa e irracional sociedade. Ele se faz “nobre” e único objetivo e meta nas mãos dos amantes da ambição e do egoísmo e, nesta matemática do ter que só opera a soma e a multiplicação, a parte mais frágil da sociedade, em tão maior número, vem a cada dia sendo subtraída e  subtraindo-se, exercendo e executando, à força de sangue e dor, a divisão do que há muito se fez indivisível.

A batalha está perdida. O Socialismo que um dia sonhou socializar o mundo, dis-socializou-se. Saiu de cena antes de se apresentar e por isso, não foi entendido. Em sua primeira versão, antes de se aperfeiçoar, foi tolhido em suas ideias e tragado pelo trator negro e valorado materialmente do extemporâneo capitalismo que não considera e nem respeita nem tempo e lugar, muito menos vida e gente.

A batalha se perdeu e as sociedades perecem vítimas do seu próprio desamor para com o seu igual e vencidas pelo maligno e insensível existir do ouro e do poder, e, por consequência, pela inteligência humana que se faz insana quando o assunto é ter e acumular e... sempre ter mais.

A razão está devidamente comprometida e perdida e a emoção responde pela sandice e imundície que somos.

Sandice e imundície que somos enquanto sociedade criada à imagem e semelhança de Deus.

E que ele, DEUS, nos perdoe, se houver perdão.

Roberval Paulo

CANÇÃO DO INEVITÁVEL - Roberval Paulo

A morte é sempre chorada, mesmo sendo inevitável
É tão irremediável que se sente inesperada
Não é por ninguém esperada, é talvez inconveniente
Chega e se vai num repente, na insensatez de uma flecha

Não sei se falsa ou honesta, nem tão pouco inconsequente
É feito água vertente brotando da pedra bruta
Não é estúpida, é astuta
Só chega quando é chamada
Um chamado inconsciente que a mão humana não entende.

A morte não é demente... é lúcida, é despachada
É sutil tal qual o nada, é razão da existência
É um nó na inteligência que vê nela uma equação
Que se vai a resolver mais a fórmula não norteia (clareia)
É refém da dor alheia, ninguém sabe a solução.

A morte não é estação que vem no seu tempo e passa
A morte é viva e inata, é bela e nasceu com a vida
É imune à dor da partida, sabe ser esta um presente
Vem do passado ao futuro para ser somente história.

Não é fracasso nem glória, é simplesmente verdade
Não sabe credo ou idade, só que é preciso agir
Não tem de não querer ir, tem mesmo é que viajar
Percorrer a velha estrada que é nova em cada partida
Curar de vez a ferida que a vida sempre chagou
Com amor ou desamor, se mostra na despedida.


Roberval Paulo

TEMPO - Roberval Paulo

O tempo da vida é curto pra se fazer o que se quer fazer
Aquela música que eu queria aprender
Aquele livro que eu queria ler
Aquele filme que eu queria ver
Vão passando por mim no meu tempo que não me dá tempo
Nesse tempo que não me dá tempo de viver.

O tempo da vida é tão curto que não me dá tempo
Que não me dá tempo de fazer um sonho se realizar
Porque você começa, começa, começa...
E antes do fim, já é tempo de parar
Parar e recomeçar a viagem
Que é o começo do fim que de novo se vai a começar.

O tempo da vida é curto para ver o sol se pôr
Ele nasce e sobe, sobe e se descamba a descer
E você vai subindo
E quando alarga o caminho
Já é hora de entardecer, de adormecer
A hora de ficar verde antes de amadurecer.

O tempo da vida é curto para ver o dia passar
Você trabalha, trabalha,
E quando a vida embala
E a moça se põe na sala à espera do seu querer
O pai assim recomenda; a lua já deitou renda
De manhã cedo, a venda. Tú tens que amanhecer.

O tempo da vida é curto pra se fazer o que se quer fazer
O sonho que eu sonhei. A vida que eu planejei
A estrada que não se chega ao fim
Ficou tudo preso no tempo
No tempo que se foi com o vento
Um tempo que não ficou em mim.


Roberval Paulo

ESCREVER - Roberval Paulo

Parei de escrever
Há muito que não sei o que a caneta quer dizer
Meus dedos no teclado não deslizam suavemente
Vão andando em solavancos
Atropelando palavras
Que vão deixando o meu texro
Vazio e o meu ser.

Há muito que não sei o que escrever
Meu pensamento divaga
Por órbitas desabitadas
À busca de uma existência
Que não mais reside em mim.

Não sei mais nem como ser
O ser feliz que eu era
Que numa doce primavera
Me estacionei nesse sonho
De existir e perseguir
O que eu desconhecia
Mas que seguia guiado
Pela luz no horizonte
Guardada no fim do túnel
Que eu tenho que nele entrar
Para enfim assegurar
O meu destino de ir
E vir por aquela estrada
Que é a mesma da ida
Quando a hora é de chegada.

Roberval Paulo