sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

NOVELOS DE AMAR - Roberval Silva



Ainda que de sol e mar seja eu feito
sou e sempre serei igual a ti e a mim
como se fôssemos um só
como se fôssemos todos em apenas um
que de tão iguais somos até diferentes

somos mesmo diferentes e de caminhar e sorrir
nos vemos seres antes fosse dois ou mais ou todos
e assim quero me perder em ti antes que em mim
e sentir o doce aroma da vida extraída subtraída do meu ser
quando o assunto é você

e na vertente da nascente água da vida
cingir de brisa e flor o frescor do teu corpo e alma e coração
qual vulcão se vestindo de calor se contorcendo de dor
não de dor mas de dor de prazer de querer se perder no valor do amor
amor meu e teu e nosso se amando se dando doando

a paz sonhada tão pensada idealizada e necessária
às almas descentes carentes de tanto querer
se achar se encontrar e seguir na rota da vida
subir na descida por tanto lutar e descer ao seio de todo amor
que amar é o princípio de tudo a razão deste mundo
o porque de estarmos aqui neste sol faça chuva frio ou calor

viver é sentir respirar sentir dor deleitar no perceber da glória
construir a história vivendo infortúnios às vezes na lama em outras na cama
a cair me levanto contemplo me espanto me arranco em disparada
tenho a alma asada de andar viajar conhecer se entender
entender as gentes manter latente a chama viva da vida
em mim e em ti e em nós

que ainda que de sol e mar seja eu feito
sou e sempre serei igual a ti e a mim
como se fôssemos um só
como se fôssemos todos em apenas um
que de tão iguais somos até diferentes
somente um somente nós e a vida por nós a passar
nos levando em novelos de enrolar
desenrolar nossos sonhos que de tão amar juntos
somos muito a sós
entre nós
a caminhar.

Roberval Silva

O SISTEMA POLÍTICO E A EVOLUÇÃO DO TER - Roberval Silva


Sucesso não é só ter dinheiro. Dinheiro é importante e necessário porque o mundo é capitalista e dele se precisa para viver. Porém, sucesso, não é só ter dinheiro.

Ter sucesso é estar em paz consigo e não perder a essência do natural, a autenticidade e os valores familiares, éticos e morais. Se harmonizar com o mundo, coisas e pessoas, situando-se passivo e serenamente no ambiente no qual está inserido.

Ter sucesso é poder levantar-se todo dia com a consciência em paz e, à noite, voltar para o aconchego do seu lar ainda em paz e poder dormir o sono dos justos.

Ter sucesso é compreender o contexto e a conjuntura da qual participa, ter voz ativa e consciência coletiva para discernir e assimilar que a estrutura é de todos e todos dela dependem, buscando, inteligentemente, o ponto de equilíbrio necessário à sobrevivência de todos.

Precisamos nos mexer. Não sei como mas precisamos lutar contra o poder do ter em detrimento do ser. O dinheiro virou a verdade absoluta das coisas e tudo pode por ele. Tudo é permitido desde que o objetivo seja angariar e ganhar mais e mais. Acostumamo-nos a isso e fermentamos em nós a insensatez, a indiferença e impotência diante da situação.

Ressalto sempre que o dinheiro é importante e é necessário tê-lo, pois é com ele que compramos a nossa casa, o nosso carro, a faculdade do nosso filho. É ele, o dinheiro, que nos permite desfrutar de tanta coisa boa que a vida oferece, satisfazendo e massageando o nosso ego e vaidade. O que refuto é que o TER não pode sobrepor-se ao SER.

Observem quanto caótica é a nossa realidade. Não existe, em nosso país, nenhum outro segmento que, num intervalo de tempo tão curto, promova mais o enriquecimento ilícito de pessoas do que o sistema político. E não tem, para isso, uma explicação lógica, pois, somando-se todas as rendas e subsídios percebidos oficialmente, revela-se uma discrepância e incompatibilidade enormes em relação ao patrimônio adquirido.

Mas todos consideram normal e isso mostra o quanto somos acomodados e alheios à nossa realidade e o quanto nos corrompemos também.

A realidade é cara e se apresenta aos nossos olhos para ser comprada todos os dias na sua forma mais dura e cruel.

Ø  Meninos abandonados e unidos nos sinais de trânsito das grandes cidades ou nos pátios tortos das praças mortas, tão pequenos e maltrapilhos que nem gente parece, tendo sacos de cola como alimento e roubando, roubando o que a sociedade lhes roubou: a dignidade, a inclusão, a família.

Ø  O tráfico aliciando crianças e jovens, homens e mulheres e matando inescrupulosamente quem não aderir ou se calar ao seu poderio.

Ø  As nossas meninas, a cada dia, mais novas, expostas e jogadas nos campos de prostituição, vendendo o corpo e a alma, vendendo os seus sonhos de menina e perdendo a sua aura de anjo.

Ø  As famílias enclausuradas pelas cercas físicas e cercas do medo, assustadas e angustiadas por aqueles que o estado não acolheu e que a evolução lhes negou oportunidades.

Ø  Pais de família começando a roubar, atirados ao submundo pela necessidade, desnorteados entre a fome e a necessidade de comer, entre a dignidade e o descaso.

Ø  As cidades inchando-se dia após dia de sonhadores em busca de dias melhores e que se transformarão, num futuro bem próximo, em um novo bando de miseráveis que arribaram do campo, do interior, tangidos pela miséria e pela fome e que agora engrossam as estatísticas da miséria e da exclusão nos leitos aflitos e imundos das formidáveis favelas.

Enquanto isso, o outro lado do mundo se movimenta; a outra face da moeda mostra a sua cara sinistra. Seus jatinhos e carrões, mansões e paraísos fiscais, piscinas e restaurantes, bebidas e... mulheres meninas. E estas, usadas e descartadas, já não mais vivem, vegetam, relegadas à impureza e ao assalto da sua alma e do seu corpo. Esta é a nossa realidade e nós entendemos tudo isso como normal.

Vejam o nosso congresso nacional, que mistura! Lá tem representantes de todos os segmentos que se dizem organizados do nosso país. Só não tem, de verdade, representantes do povo, do povão mesmo, da massa. Defendem somente os seus próprios interesses e não os interesses do povo.

Coitados de nós. Somos pobres e fracos, alienados e subordinados, interesseiros e imediatistas, sem consciência social e hipócritas. Que o silêncio, a impotência, a parcimônia, a insensatez, o imediatismo, o comodismo, a omissão e a degradação humana falem por todos nós.

Sentar-nos-emos na esfera do tempo e que o cortejo das horas nos leve ao outro lado do sonho, onde a realidade já foi subjugada e a vida, sozinha e única e despida de toda podre matéria, viva, esplêndida e celestialmente, para todo o sempre.

Amém!

Roberval Silva

O AMOR EM DOCE TRADUÇÃO - Roberval Silva


Eu te amo!
Quisera mais eu falar
E falar de tempo em tempo
E para sempre
E a cada segundo
Eu te amo!

Colhestes inteiro um jardim
Em ti e em teu corpo de rosas e perfume
Sol na janela da minha vida e da alma
Quando eu dizia
Te amo!

Eu te amo!
Verbo presente conjugado ao futuro
Certo e incerto como tu e a lua
Deusas nuas de noites e lençóis
Brancos, azuis, de luz, em meus olhos
Ao dizer
Te amo!

Eu te amo!
Como a mim que me sou em ti
E em nós, esse amor
Pungente amor de sonhos
No enlear de nossos destinos
Levados aos quatro ventos
Por toda a eternidade
Nos dizendo sempre
                            e a cada dia
                            e a cada minuto  
                            e a cada segundo
Te amo!      Te amo!      Te amo!


Roberval Silva

UMA ORAÇÃO - Roberval Silva


Senhor Deus!
A tua luz em nossas vidas.
As tuas bênçãos em nossos caminhos.
A tua verdade em nossa estrada e o teu amor em nosso conduzir.

Senhor Jesus Cristo!
Fracos e pecadores que somos, somos, em nós, a tua imagem e semelhança.
Nos conduza na estrada da paz e do bem caminhar
Nos guie pela estrada do bem servir.


Roberval Silva

ESQUECIDOS - Roberval Silva


Estou por aí, na sombra nebulosa da noite, à espera do grito, do sinal, do chicote no açoite do braço. Do tiro perdido, sem alvo, a qualquer alvo, ferindo o peito já ferido e maltratado, amordaçado, desesperançado e desolado, esquecido no beco de uma lembrança apagada. Sem rosto, sem página, sem a história dos dias passados. Futuro incerto, apontado como imprevisível, um tiro no escuro; o momento seguinte totalmente desconhecido. 

Do presente, só o presente, sem embalagem e sem laço de fita. Só a dor da dor vivida e sentida, o sangue agitado nas veias a escorrer pelo horizonte dos olhos. Animal abatido num tiro certeiro, animal racional que pela irracionalidade social, irracionaliza-se, desnacionaliza-se, e perde-se o sonho rendendo-se à dura realidade, traindo a consciência, perdendo a razão, arquivando as conseqüências e o conceito de legalidade.

Pra suportar, sem opção. Só com a cabeça feita e, se faz a cabeça. Consome, se consumindo. Ingere-se, injeta-se, compartilhando tudo. Amizade inconsciente, risco inerente; gotas e partículas de morte à prestação, só apressando, antecipando o que já está decidido, escrito nos anais das sociedades. Veredicto social, fatalidade da existência, a morte. Afinal, todos cairão.

Coragem irresponsável, covarde, coragem em mim sem ser minha, alimentada pela hipocrisia, pelo descaso. E eu, sem forças, me rendo dominado, corrompido. Bicho alienado, fera acuada. Indignado e sem dignidade. Sem direitos, contado para morrer. O que fazer?

Aceito passivamente, porém, revido, agrido, matando o que em mim morreu, roubando o que de mim roubaram. É o estágio da decomposição, sem recompensa, assediado por uma falência múltipla de sentimentos. Incongruente, ferindo pela ferida enraizada n’alma, plantada pela Lei do Sistema.

Sistema posto, imposto, regado livremente sobre espontânea pressão, opressão, repressão, depressão geral, embrutecido pela demagogia, mantido pela lei do mais forte. Insanidade da sandice dos sádicos que endeusados de poder, pelo poder, acreditam na vida só aqui. Ledo engano. O processo está sendo montado, a sentença será proferida. Réu, diante do juiz, sem advogado de defesa, só acusação. O direito à defesa prescrito, findo no último dia de vida aqui.


Roberval Silva

A POESIA COMO REALIDADE ABSTRATA - Roberval Silva


A poesia é libertação e o poeta
À força de sangue e suor, sonhos e inspiração
Se prende nas palavras
Se faz herdeiro do nada
À procura da liberdade que não vem.

A poesia o seu próprio caminho tem
É esta a estrada na direção contrária da vida
E em sentido oposto corre o poeta
Semeando palavras
Descartando sonhos e encantando serpentes
De veneno mortal
Que mais tarde lhe cravarão seus dentes.

A poesia é água vertente
Descansando nos leitos da verdade surreal
Encontrando guarida só no sonho do poeta
Que, isolado e só, recria dia a dia
Os caminhos da humanidade desumanizada.

A poesia é viagem desassossegada
Ventania cinzenta colorindo nostalgias
Em verde azul e róseo trabalha a mesma poesia
E o poeta, louco e sem cor
Desfila suas dores na amargura abstrata do nada
E sangrando seus horrores em sangue e tinta apenada
Ascende aos corações o bem do amor.

A poesia é bela e o belo é amor
E o amor se mortifica frente a realidade falida
E o poeta, triste e sozinho, se desintegra da vida
Saindo à francesa pela tangente do horror
E tanto dos seus sonhos a sonhos alheios semeou
Que fez-se sem sonhos a sua própria partida.

Roberval Silva

A FILOSOFIA E A ARTE DE TUDO SER - Roberval Silv


               É verdade. Ela não tem movimento próprio. Nem vida, eu acho.
Mas como gosta de estar pelo caminho. Já viram? Está sempre no nosso caminho. Quando não é a própria, literalmente, é o seu nome.
            Você é uma.................no meu caminho!
            Você é uma.................no meu sapato!
            Lembrem-se, até JESUS citou-a quando disse a Pedro: tú és..................., em ti edificarei minha igreja.
            Ela é importante, tá pensando o que! Inclusive, quando usada como arma; esteve na funda de Davi e logo após, na testa do gigante Golias, vencendo-o. Ou terá sido Davi o vencedor, e não ela? Bem, acho que os dois venceram.
            Estão vendo, ela tem história. É quase impossível esquecer-se dela. Está presente até na dor do rim. Muitas são brutas, grossas, indelicadas. Outras são lapidadas, sensíveis e gozam de maiores privilégios. Estão sempre ornamentando valiosas jóias e esculturas; decorando lindos ambientes e estruturas. Outras são as próprias jóias e esculturas, portanto, de muito valor.
            Uma coisa, porém, não se pode negar; são infinitas as suas utilidades, serve para tudo. Bem, sem exageros, para quase tudo.
               Mais coitada. Não tem vida própria. Não vive; vegeta, ou será pedreta, pedrita, pevita? Há! Sei lá. Está por aí, no meio de nós, com vida ou sem vida. Pera aí, com vida ou sem vida? Deus meu, ajude-me; acho que me perdi. Raciocinem comigo sobre uma daquele inteligente. “Penso, logo existo”. Ela não pensa, então ela não existe???? Mas se penso nela e posso vê-la, e posso senti-la ― senti-la na mais verdadeira acepção da palavra ― ainda ontem, senti-a na cabeça numa discussão e na corrida para não senti-la por todo o corpo, não adiantou muito, pois acabei sentindo-a no dedão do pé. Também pudera; a coitada estava lá, abandonada, sozinha, perdida no meio do caminho. Eu disse pra vocês; está sempre no meio do caminho. 
                 Bem, antes de me perder, feito ela, voltemos ao raciocínio. Se posso vê-la e senti-la, isso quer dizer que ela existe, mesmo sem pensar. Ora pois, partindo desse pressuposto ou seria desse princípio? Esse português ainda me mata. Não importa; partindo dessa coisa, ou melhor, daqui mesmo, daqui pra frente, Eureka!!! Cheguei à sábia conclusão de que “pra existir não é necessário pensar.” Não, não é isso. Recapitulando. Ela existe e penso nela, mas ela não pensa nem nela, nem em mim, nem em qualquer outra coisa. Conclusão. “Penso, logo existo, mas, se não penso e outros pensam em mim a ponto de me sentirem, então existo.” Não, está tudo um tanto quanto confuso. Já dizia outro que, quando a esmola é demais, o santo desconfia, então, esse pensamento não deve estar correto, até porque a esmola não tem nada a ver com o santo nem com ela mesma. Eureka! Achei. De novo! A conclusão certa é: “penso, logo existo. Ela não pensa, mais também existe, pois eu penso por ela e sinto-a.” É, ainda ficou um tantinho quanto confuso, mais tá bom. Não vou mexer mais não, se não, daqui a pouco, eu é que não vou estar mais pensando. Nossa, agora usei não à vontade, mais, não tem nada não. Pra variar, mais nãos. Fazer o que, pra dizer não tem que usar não, senão, não é não, não é mesmo. Mais chega de nãos, vamos ao que interessa.
                Antes dessa coisa de pensar e não pensar, existir e não existir, eu estava falando sobre uma coisa. Droga,  já repeti de novo, agora, foi a vez da coisa. Tudo bem, deixa pra lá. Vamos à revelação. De quem eu estava falando? Ou melhor, do que eu estou falando? Quem adivinha? Já descobriram? O que! Sabiam o tempo todo? Eu dei muito na cara; dei bandeira né. Assim perdeu a graça. Todo o tempo falando sobre a pedra, coitada, com um ligeiro suspense, pra fazer a revelação só no final do texto e logo no começo, vocês já haviam sacado. Mais não tem nada não. Eita! Quanto não. Sai do meu caminho não, parece pedra. Não e pedra, pedra e não, desimportante. O importante é que conhecemos um pouquinho mais da vida desta já tão depedrada pedra e, deixando a modéstia ― a pedra ― de lado, um pouquinho mais de filosofia também, não é verdade? Podem confessar, eu deixo. Eu faço uma confissão. Não sei e não sei mesmo porque a pedra, ou a srª. Pedra, ou dona Pedra e, já que existe, pode até ser o bicho pedra, ou seria bicha, por se tratar do feminino? Não sei e como eu ia dizendo, não sei “de novo” porque esse trem ― coitada, é trem, é coisa, é pedra, eita português ― chamou tanto a minha atenção, fazendo-me escrever tanto. Essa coitada leva uma vida tão besta.
             Como podem ver, não fala; não escuta; não sente; não chora; não vê, quase sempre é vista; não tropeça, os outros é que tropeçam nela; não anda e, com um tremendo esforço mental, recorrendo inclusive a Descartes, concluí que ela também não pensa, mas existe. Repito. Pode uma vida mais besta?
               Bem, dentro de uma análise filosófica, eu afirmo: pode. A minha própria. Falo, escuto, sinto, choro, vejo, tropeço, ando e penso; e sofro. Vocês podem me perguntar. Nossa, como ele pode comparar uma vida humana tão ativa à vida de uma pedra? A vida de gente à vida de animal? E eu lhes responderei.
            Primeiro, pedra não é animal. Pedra é “matéria mineral dura e sólida” ― (Dicionário Aurélio). É da família dos que não pensam, mas existe, acho.
              Segundo e também pra finalizar, por ironia do destino ou não, ou por ironia da própria pedra “filosófica”, ela não sofre, ao contrário de mim, que sofro e muito, não podendo calcular a extensão nem a dimensão desse sofrimento. Mais sei que é tão grande que está me sufocando e já não consigo falar, escutar, sentir, chorar, ver, tropeçar, andar e nem mesmo, pensar. E se não mais penso, já não existo, ou existo, porém, sem pensar, tendo que esperar e me contentar com o pensamento dos outros para existir, se é que há alguém capaz de pensar em mim como eu penso na pedra. Porquanto, já privado de todas essas faculdades, não sou mais que ela. Não sou mais que uma pedra.
            Quisera eu ser como tú Pedra, que, sem vida própria, não pensa; e sem pensar, não sente; e se não sente, não sofre; e se não sofre, é mais feliz do que eu.


Roberval Silva

OLHOS NOS OLHOS - Roberval Silva


Quando tua mão pesar sobre mim, lhe direi:
Porque tantos anos de infortúnio sobre a terra?
Porque tanta dor se o que buscamos é o amor?
Se me ouvirá, não sei
Se tenho razão, menos sei ainda
Só acho que o que ainda sei é amar.

Quando tua voz me pedir contas do que fiz, lhe perguntarei:
Posso eu também pedir contas de ti?
Podemos conversar, só conversar, sem cobranças?
Podemos nos sentar e nos falarmos como dois amigos?
Não sei se assim pode ser. Menos ainda sei se assim posso agir.
Só acho que o que ainda sei e posso dizer é que eu amo.

Amo a vida que tenho e não sei se me pertence
Amo o ventre que me gerou e me concebeu
                                               e o rebento do qual sou raiz
Amo o patriarca da minha humilde existência e aos irmãos e irmãs
                                               de lastro familiar que me destes
Amo as forças conhecidas da natureza, alimento indispensável para a vida
Amo ainda as forças desconhecidas da natureza, sinais latentes e incessantes do teu poder e glória e amor.

Quando teus olhos me olharem e eu neles perceber
                                               um olhar de interrogação, lhe responderei:
O que queres de mim?
O que queres que eu faça se tudo o que fiz não valeu?
Em que Pátria nos desentendemos? Em que corpo me perdi?
Não sei se me ouvirá. Nem sei se assim posso indagar a ti
Só sei que o que ainda acho que sei é da força do amor.

Da força do amor que tudo pode e é só por ele que se vive
Da força desse amor que se justifica por si só e se qualifica por só ser
Da força do amor transcendente, completo em si, sem complementos, sem acessórios, sem adereços. O amor só pelo amor.
Que este sim, é infinito e não se paga imposto pra amar
Que este, o amor, é o que sinto e está no recôndito mais fundo do meu ser
Alimenta minha alma e só por ele se vence grandes distâncias e  as agruras dos dias
E também sei que só o sinto pela tua suprema e magnânima existência, pois, só matéria e pó como sou, não seria capaz de amar sem o teu sopro de amor infinito.

Quando teus olhos novamente me olharem e apresentarem aos meus olhos o olhar da reprovação, eu... 
me penitenciarei
E lhe direi quanto mais do teu amor ainda resta em mim?
E lhe perguntarei o quanto ainda sou capaz de amar?
E lhe responderei que ainda procuro o que nem sei se é possível achar
E, olhos nos olhos, chorarei
E pedirei perdão pelas minhas faltas
E pedirei perdão por duvidar de ti
E da tua bondade infinita me impregnarei e me agarrarei, me agarrarei à tua mão para não mais soltar.
Me agarrarei à tua mão para reerguer-me e não mais voltar a andar sozinho.

Sei que me perdoarás
Sei que não me abandonarás nunca como jamais abandonou um filho teu.
Aí sim, a luz se acenderá e juntos, juntinhos, lado a lado, caminharemos pela vastidão dessa estrada para não mais nos separarmos.
Dessa estrada que só se caminha, que só se caminha, sem saber onde vai dar
Mas agora, confiante caminho e a eternidade nos espera
Pois já não ando mais sozinho e tenho o amor a me guiar.


Roberval Silva

O PASSAR DESSA VIDA - Roberval Silva



Nem que eu viesse a sofrer todo o fim da dor do mundo,
Não seria nada perto do que sofreu Jesus Cristo
Não seria nem a sombra do que sofreu nosso rei
Pois que todo sofrimento já lhe foi antes prescrito.

Nada lhe foi perguntado se ele assim aceitava
Já nasceu com esse propósito, Ele tinha que cumprir
Deus Pai assim ordenou. Ele, Filho, obedeceu
Carregou a sua cruz, tinha uma estrada a seguir

Estrada essa lavada na dor do seu próprio sangue
Para que fôssemos libertos do pecado original
E nós não nos atentamos “prêsse” tão nobre martírio
Continuamos em nós plantando a raíz do mal

E nesse inferno astral de céu para quem padece
Padecemos por querer, por não querermos amar
Tal qual amou Jesus Cristo, nosso Deus e nosso Pai
Amou tanto que morreu pra humanidade salvar

E a humanidade até hoje não entendeu esse gesto
Não quis amar, não quis paz, se arvorou a ferir
Fere o igual, a si próprio, fere o seu Salvador
E se entende soberana na ilusão do existir

Não sabe esta humanidade que aqui estamos passando
Passar é o que nos cabe... vamos a um outro ninho
E nessa passagem o ingresso pra eternidade alcançar
É o amor, a humildade que dispensar no caminho

Nem que eu viesse a sofrer toda dor... a dor do mundo
Não seria nada perto do amor de Deus por nós
Ele amou de tal maneira o mundo que enviou
O seu filho Jesus Cristo e até o matou por nós

E o matando, libertou a vida no mundo inteiro
E o fez ressuscitar, Deus vivo, subindo ao céu
E a humanidade sem rumo viu a luz do novo mundo
Mas não a quis, desprezou e vive vagando ao léu.


Roberval Silva

DESCAMINHO - Roberval Silva


Tem hora que a estrada fecha
Tem vez que o caminho acaba
É aí que o rio enche
E não tem jeito, deságua
Deságua água no mundo
A quem quer, a quem não quer
E a estrada fechada
Em dilúvio é desmanchada
Indo ao revés do moinho
E o caminho acabado
Se vai assim desaguado
Em outro novo caminho

O caminho que se abre
A estrada que continua
Mas seu humilde passante
Nunca mais será o mesmo
Será um outro do mesmo
Seguindo um outro caminho

E o passante, enluarado
Novo estradar aventura
Ainda mais caminhante
Ainda mais açoitado

Mas nunca mais será o mesmo
Novo caminho em começo
Endireitando-se o avesso
De um caminhar renovado.

Roberval Silva

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

PROVERBIANDO - Roberval Silva


De longe não dá pra se ver o perto
À distância tudo fica pequenino
No vão da noite os gatos são todos pardos
E o ancião reincorpora o seu menino

No passado o presente é o futuro
No presente passado ficou pra trás
No futuro presente e passado foram-se
Sobra o momento que é real e tão fugaz

Devagar dizem que se vai ao longe
O apressado come cru, ouço dizer,
Quem espera, no dizer, sempre alcança
Mais pra chegar onde se quer tem que correr

Diz-se do inconveniente, já vai tarde,
Do agradável, se escuta, fica mais!
Quem se gosta, quando vai, deixa saudade
Ao indesejável, quando vai, não volte mais

Deus ajuda quem parte pela madruga
Mais dormir nunca foi e nem é pecado
De quem viaja só se espera a chegada
Ao que não foi, melhor esperar sentado

Todo ser tem que carregar a cruz
A cruz que é sua ninguém leva pra você
A estrada torta tem a sua parte reta
Tudo o que sobe uma hora vai descer

Só se levanta quem se permite cair
Todas as águas vão se desaguar no mar
O caminhar de qualquer um é bem assim
Subir e descer é o seu aperfeiçoar.


Roberval Silva

O ESTOURO - Roberval Silva


O estouro de uma boiada
Coisa que ninguém entende
Do nada te surpreende
E sai tudo em disparada
Do nada fazem parada
E volta tudo ao normal
Caminhando tudo igual
Parecem até uns anjinhos
Tudo emparelhadinho
Mas deixa um estrago real

Deslocando passo a passo
Seguindo no passo lento
Se butar no enquadramento
Dá medida de compasso
Basta um pequeno mormaço
Já levantam a cabeça
Caso isso aconteça
Se prepare para o estalo
Principiou o disparo
É grande o quebra-cabeça

São tão passivos os bichinhos
Seguem pastando contentes
Se vão subservientes
Pelas trilhas do caminho
Uma juriti sai do ninho
O anum dá seu piado
Um graveto espedaçado
Anúncio do alvoroço
Vira um angu de caroço
De cascos em burburinho

Lá vai andando a boiada
Feito cobra rastejando
Lentamente vão pastando
Na paisagem estiada
Uma baladeira armada
A pedra parte certeira
Um menino lá da feira
Botou a feira em perigo
Parece até um castigo
Na feira tudo é carreira

Do jeito que começaram
Pararam sem ter por que
Nem cansaram de correr
Ao passo lento voltaram
O estrago que causaram
É prejuízo medonho
Na venda de seu Totonho
Não ficou um item em pé
Dona Mercês diz, pois é
Eita vaqueiro bisonho!


Roberval Silva

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

LUZ DO INDECIFRÁVEL - Roberval Silva


Paredes de vento e concreto
Dor e prazer, agonia
Vida e morte, todo dia
Amor, paixão e desejo
A natureza do beijo
Autofágica sinergia
Florescer da anatomia
Carnes, e partes e formas
Momento, tempo presente
Cimento, sólido tear
Chão, vulcão e passamento
Rebentos, ondas geladas
Sensações desenfreadas
Química, corações e velas
Degelo, solar-lunar
Átomos das cores mais belas
O metafísico eclipse
Na geografia dos corpos
Mistério, chaves, segredos
Passíveis de desenredo
Sangue, nervos e magia
Explosão, disritmia
Possível punhal do tempo
Abismo de nostalgia
Bocas úmidas, gritos roucos
Labirinto de vontades
Revelando o inconsciente
Na luz do indecifrável.


Roberval Silva

DA GERAL - Roberval Silva


DA GERAL, observo a vida passar por mim na direção do desconhecido e me posiciono como se fosse um imã para que a vida possa em mim grudar e não mais fugir.

E assim, encho-me e recheio-me de vida, seguindo com ela a estrada da luz à procura da morte que, viva, me pede perdão e se esgueirando feito cachorro vadio, grita por socorro ao se entender morta.

Eu, vivo, observo tudo em silêncio e não posso disfarçar uma lágrima clara e fria que escorre pela minha face ao compreender que o grande segredo da existência é o que inexiste e a porta de saída para a próxima vida é o encontro com ela: a mãe que a todos acolhe e a ninguém rejeita.

Meus pensamentos caminham desordenados e inquietos pelos labirintos do medo e transportam meu ser à legião de um sonhar desesperado, sabendo esse desespero ser a esperança em sua mais perfeita tradução, pois que a vida ainda está por aqui e, DA GERAL, ainda observo a passar por mim o cortejo fúnebre que ora vivia e que segue ao destino do fim que é, e será, nada mais, nada menos, o começo de tudo.


Roberval Silva

PERDEMOS A BATALHA - Roberval Silva


As famílias choram e as lágrimas e gritos se espalham e se perdem, sem ser ouvidos, na insensatez e insensibilidade desumanizada de uma sociedade sem norte.

A dor não cicatriza e se sente mais e mais a cada dia, sem alcançar o porque, a razão; o motivo do nascer sem cura.

O que era família já não mais se vê nem se sabe. Os valores se perderam no precipício do que um dia foi princípio...

A ética e a moral só um pouco ainda existem, bem pouco, e o egoísmo e a ambição, associados à individualização do ser, hoje falam por si só ou pelo seu grupo de iguais, agrupando-se pelas conveniências do lucrar mais em detrimento do que um dia foi a classe humilde, mas abastada, que, mesmo habitando o lado esquerdo da moeda, tinham o seu valor, pois a dignidade mantinha-se no exercício do seu auto e garantido sustentar.

Hoje não mais. O que foi família já não se vê. Os valores se foram na evolução imaterial, revertida na agregação e adição surtada da razão à emoção do material, que, se agiganta em importância nas relações que já foram de amor, transformadas hoje em mero comércio no objetivo seco e bruto do quem ganha mais.

O capital é a razão de ser da nossa inescrupulosa e irracional sociedade. Ele se faz “nobre” e único objetivo e meta nas mãos dos amantes da ambição e do egoísmo e, nesta matemática do ter que só opera a soma e a multiplicação, a parte mais frágil da sociedade, em tão maior número, vem a cada dia sendo subtraída e  subtraindo-se, exercendo e executando, à força de sangue e dor, a divisão do que há muito se fez indivisível.

A batalha está perdida. O Socialismo que um dia sonhou socializar o mundo, dis-socializou-se. Saiu de cena antes de se apresentar e por isso, não foi entendido. Em sua primeira versão, antes de se aperfeiçoar, foi tolhido em suas ideias e tragado pelo trator negro e valorado materialmente do extemporâneo capitalismo que não considera e nem respeita nem tempo e lugar, muito menos vida e gente.

A batalha se perdeu e as sociedades perecem vítimas do seu próprio desamor para com o seu igual e vencidas pelo maligno e insensível existir do ouro e do poder, e, por consequência, pela inteligência humana que se faz insana quando o assunto é ter e acumular e... sempre ter mais.

A razão está devidamente comprometida e perdida e a emoção responde pela sandice e imundície que somos.

Sandice e imundície que somos enquanto sociedade criada à imagem e semelhança de Deus.

E que Ele, DEUS, nos perdoe, se houver perdão.

Roberval Silva