terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

A RETA TORTA DA VIDA - Roberval Silva


Indo
        infindo
me findo
               reto
                          na reta
                   torta
    insólita
                morta
                          apócrifa
                                       sonífera
                         efêmera
          dormindo.  


                                                    Vindo
                                       a caminho
                               moinho
                     rodando
      a vida
                levando
                             morrendo
                                             sozinho.


Roberval Silva

REMINISCÊNCIAS DE UM MORTO - Roberval Silva


Quando morri para os dias da vida
E parti na garupa da moça branca de neve
Vivi a enganação dos vivos
E ali, mortinho da silva, me vi carregado
Em ombros que eu nem conhecia

Lágrimas, muitas eu vi
De quem eu nem conhecia o pensar
E ao amigo olhei e caí a cara morta
Estava os olhos vidrados
Nos seios da viúva minha

Morri, é a quarta minha morte; não sabia morrer
Se soubesse não estaria vivo nesse corpo morto
Me vendo falsidade em olhos que tanto amei
Me rindo de bocas a quem nunca falei
Chorando a hipocrisia de vivos me querendo morto

Morri, já sinto a vida da morte
Roupa branca, mãos ao peito e suaves flores
Meu corpo deitado no caixão. A sala cheia
Amigos, parentes, desconhecidos e,
Minha Mãe
As lágrimas verdadeiras; soluça, como soluça
Sofre e mais soluça e se agarra ao morto seu
O morto que gerou em suas entranhas e não mais vive
Um corpo sem vida, que ainda vive, inanimado
Animado pelo amor de minha mãe, que jaz, mortalha viva
Parece que ela é quem morreu

Quis voltar da morte com uma mínima vida
Só para consolar-te Mãe, mas,
Estou morto e sinto o cheiro do morto que sou eu
Aquele cheiro que só velório sabe exalar
Mistura-se ao cheiro de flores mórbidas e de lutuosas velas
Velas em chama sem a chama da vida

Viver é muito perigoso, já dizia o poeta
Viver não é só perigoso; é muito mais que isso
Diz esse morto ainda quando a vida lhe vicejava
Ainda mais quando a morte se morre viva
O enterro vivo do morto que não morreu

Ser enterrado vivo mesmo quando jaz morto
Sem entender, o morto, ali, vendo a vida
É o medo visitando este corpo inerte
E perfura minhas carnes mortas com pontiagudos diamantes
E meu sangue escarlate de um róseo azulado
Escorre pelos meus dentes ausentes de vida

Meu corpo já sinto nada, matéria podre e fétida
Se decompondo, putrefacto, ossos e sangue gélidos
As carnes e vísceras rasgadas e inúteis e belas
Nos olhos e ouvidos, os vermes fazendo festa
Sinto o medo da morte que já vive em mim
A morte viva que nos vem mostrar o óbvio
Na terra o ópio, cabeça rolando e línguas e bocas
Aos urubus atônitos com seus olhos de desprezo

À terra que aceita tudo, resignado me vou
Ao pó voltar para a vida morte prosseguir
E amanhã, eu pó, possa florar uma goiabeira
E ali, em fruta, alimentar uma sabiá
Que me vem bicar os sonhos que eu não soube usar em vida

A morte morta já é mais do que a vida
Morto só se sabe sendo terra, sendo pó
E de ti, ver nascer tão doces frutos
E águas e plantações e lavouras de todo gosto
Que vão engordando a vida na estrada do matadouro

Nessa verdade, eu quis até chorar
Mais ao morto não se permite nem mesmo lágrimas
Ao morto só é dado o pó da estrada
Por onde caveiras vivas trafegam e suam e riem
E lutam e choram e sonham e tudo vivem
Sem saber que esse caminho e essa poeira impregnada
Tantas vezes percorrido, tantas vezes repisada,
É inexplicavelmente, o seu futuro e eterno lar.


Roberval Silva

NOSSA DURA REALIDADE - Roberval Silva

É como se a máxima do cada um por si se consolidasse ainda mais com a evolução dos tempos e o Deus por todos permaneça só nos sonhos dos mais humildes e menos favorecidos nesta seleta maratona da sobrevivência digna protagonizada pelo capital – celebridade em alta – e pelos governos que vêem no capital o parceiro certo e insubstituível para a desigual acumulação material e a consequente produção e manutenção do produto miséria no percentual maior da população, produzida exatamente, premeditadamente e deliberadamente, para alimentar o podre e inescrupuloso sistema que tem como combustível para o seu ambiente de luxúrias e prazeres, a fome, a dor da fome e da humilhação de pais, e mães, e filhos e filhas ainda puros, espalhados por esta imensidão de terras sem fim, de Áfricas e Américas, em quantitativos que não se conta, que mais parecem estrelas que perderam o seu brilho para o brilho maléfico de umas poucas “estrelas” egoístas que querem para si o tudo do nada, até que o nada nem pelo nada seja mais sentido.

Estrelas estas que já não habitam o céu; estrelas que habitam o inferno, se é que este existe, porém, sem demônios; um inferno só de vidas a se acabar pelo completo abandono de quem um dia pensava herdar um céu de verdade.

A nossa realidade não é de luz.
Como enxergar luz em inocentes filhos cadavéricos sugando o seio cadavérico de mãe cadavérica que jaz morta e ainda se sustenta de pé pela vida morta que trás ao seio para alimentar com a teimosa vida que tem dentro de si nas gotas mirradas do seu leite?

Como ver brilho nos olhos inocentes de milhões de crianças que em carne e osso choram a humilhação da fome e do descaso e só desejam um naco de pão e leite para fazerem a alegria dos seus desesperados e impotentes pais e para sustentarem a vida que não pediram pra ser?

Como ainda se iluminar com a deterioração da instituição família que, hoje, desprovida dos seus valores morais, espirituais, de respeito, de caráter e até mesmo de razão, caminha desordenada e desorquestrada para o ambiente “seguro” do ter, perdendo nesta terrível caminhada a razão consciente do ser?

Como enfim dizer que há luz neste mundo desigual onde impera a violência, onde se perdem as crenças, e assim recriam outras crenças mas que sempre as novas crenças são só dom de acumular riquezas e mais riquezas materiais, só materiais, e em pouquíssimas mãos em detrimento de uma enorme maioria a quem só sobram migalhas pra seus sonhos suportarem e suportam, e se suportam só com  sonhos que, com o tempo, se vão a definhar pois que sonhos não alimentam estômagos e sem estes tão necessários alimentos se vão gerações inteiras, sem sonhos, desencantar?

O mundo é desigual; o mundo é desumano. A vida é desumana mas não precisava tanto. Que todo ser existente e vivente tivesse, simplesmente, sua dignidade e sobrevivência asseguradas e que o justo fosse a diretriz primeira de governos e cidadãos e até mesmo desse capital egoísta que não tem vida própria mas que vive na pobre vida daqueles que se entendem e se pensam vivos e ricos, não sabendo estes que a riqueza de espírito e de alma é superior e esta não perecerá enquanto que a riqueza material passará e voltará ao nada de onde se originou, e aí, nada mais existirá a não ser o espírito, o espírito puro e livre das tentações materiais.

Estes herdarão a eternidade, a vida eterna e, aqueles, aqueles que nesta passagem cultivaram o ter já não mais serão, como nada mais saberão de si. Serão fadados e condenados ao fim eterno que não se sabe inferno ou se panela de ferro mas que será com certeza de tribulações sem fim. 

Roberval Paulo

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

PRA NÃO DIZER QUE EU DISSE ALGUMA COISA - Roberval Silva

Tive um sonho e sonhei que era um anjo e aquele anjo sem asas, mas que, pela força do invisível e do mistério do incerto, voava e mais voava; voava que nem sabia como era a estrada de andar. Um anjo sem asas e que de nada entendia nem mesmo porque era anjo e nem mesmo o que é ser anjo, mas que, inexplicavelmente, voava, voava e mais voava.

Abri as asas que eu não tinha e ganhei os céus. Eu era esse anjo que asas ele não tinha. Subi, subi alto e contemplei, lá de cima, o altar. Um imenso boneco redondo, nas cores azul e verde e pés e cabeça alvos como neve. Refleti sobre aquela imensidão de espaço vazio e pude perceber a distância do meu pé ao meu pensar. Aquele espação infindo a perder de vista e nada para todos os lados, e direções, e sentidos, e só aquela bolinha em azul e verde, e branco nas extremidades, vagando ao leo, sem destino, suspensa no ar e sem amarras para lhe segurar.

Não entendi o mistério e mesmo se buscasse entender, não entenderia. Aquela bolona imensa, pequena diante do vazio do espaço, mas, imensa e desorquestrada, se comparada a mim. De terra e água é seu ninho; de mato e bicho seu peito, e ainda de gente, em todo o seu sentimento e muito de tudo. Milhões e milhões e até bilhões de tudo, portanto, pesada; pesada não, pesadona, e suspensa no vazio do espaço, sem cordas e não cai. Suspensa pela massa do ar e andando ao vento pelo tempo, sem parar e sem ninguém no volante. Não consigo entender nada. Quanto mais me findo nesse propósito, menos entendo. Dizem que é uma tal de gravidade ou lei da gravidade, não sei.

Na verdade, eu nem sabia se existia essa gravidez, nua e filha, nem sei de quem, a viajar pelo espaço, sem amarras, nem cordas, totalmente suspensa, sem raiz, a andar sem destino e sem direção, na órbita de um pensar que não é atmosférico. Penso que vai à procura do Apocalipse final que, a bem de uma outra verdade, eu também não sei o que é e nem onde mora, se é que ele tem residência; ou será que seria ele mais um descamisado andarilho pelos trilhos da esperança e que ao fim só encontra um mar de terra para guardar seu corpo ínfimo e pouco que descansa, leve e morto, ao pé de um jacarandá?

Penso mesmo que essa mãe que às vezes se chama terra, viaja sonho afora é em busca do pai que perdeu. Do pai de sua gravidade gestada em um tempo inexistente e distante, feito minhas asas que um dia estiveram em mim e que ao anúncio da criação dos filhos do gênesis, povoaram o olimpo. Assim zeus se fez Deus para apadrinhar a insensatez da mitologia fora do seu tempo mas que caminhava para encontrar a porta que culminasse e se materializasse nos trilhos da obscura luz da última realidade, ou, pelo menos, que fosse uma janela e, mesmo sendo a passagem, mais estreita, poderia por ela saltar ao espaço do precipício sem fim que é a viagem sem destino e sem direção e também, sem comandante, da mãe que procura pelo pai da gravidade gestada em seu ventre, que subiu e não desceu e, que quando desceu, acabou descendo mais do que o necessário para voltar a subir e, não mais subindo, passou do destino e não mais encontrou o caminho de volta.

Assim se deu a viagem do anjo sem asas que nada de gravidez ou gravidade foi ao espaço buscar, mas que viu e se solidarizou com o choro das estrelas, lágrimas estas que diziam da estupidez exasperada daqueles seres ingnóbios que mais pareciam micróbios que cavavam sem parar o corpo daquele corpo que ainda hoje viaja mas não encontrou parada nem a estação pra estacionar, e nessa viagem sem fim leva toda a nossa vida e as nossas forças e sonhos para o espaço de um lugar que não se sabe onde é e nem se lá vai chegar mas que como todo ser que pisa os degraus do medo vai sem medo para a morte que fica na encruzilhada do canto daquela estrada que não se sabe parida ou se já foi a abortar.

Não desci do meu sonho, só acordei e, quando os olhos eu abri, estava ali, na minha frente, me olhando com aqueles olhos que eu não sei decifrar, o filho do pai que um dia partiu pra órbita da dor e deixou sozinha, a mãe, que viaja sem parar, e chora, como ela chora e suas lágrimas fizeram o mar e esse se vai a encher pois ela não para de chorar porque o pai não encontra e o filho é que aqui está e a mãe ainda nem pariu, só chora e chora e me olha junto com o pai que é seu filho e me chama, me chama e eu, que acordei agora, não sei se já é a hora de seguir não mais eu órfão ou se aqueles olhos de pai de mãe e de filho que é filho do pai da noite vai ainda permitir que o meu corpo comece essa viagem a seguir e que a cria do medo, do meu ser que desconheço me revele o segredo de não mais ter pesadelos e em paz poder dormir.


Roberval Paulo

SONHO DO ETERNO - Roberval Silva


Da vida só quero sonhos...sonhar, sonhar e sonhar
Reaprender a amar quando o sonho assim pedir
Falar quando outros calarem, assim serei entendido
Silenciar quando em mim se perder qualquer razão
Libertar a emoção se esta é razão de enlevo
Saber que eu tenho medo para não ser imprudente
Entender que os direitos são de todos neste mundo
E só quem paga os tem, isso sim é absurdo.

Não quero nem mais ter sonhos, quero mesmo é realizar
Realizar a justiça gratuita a todo vivente
Ressuscitar o amor que restou adormecido
Restabelecer a fé que move até montanhas
Dignificar o ser à luz da única verdade
Na verdade de que o justo é o caminho a seguir
Que o amor não se perdeu, só está em letargia
Guardado na hipocrisia da humanidade perdida
Ferida na ambição e egoísmo dos iguais
Iguais só na Lei Divina que em tudo faz justiça
Que permite o livre arbítrio e observa o que vai ser
E um dia vai cobrar o que a história escreveu
E no fim vai encontrar tudo que a vida perdeu
É o juízo final pra vida eterna nascer.


Roberval Silva

POEMA DO GRANDE AMOR - Roberval Silva


Quão bom seria se todos os casais tivessem
Paz!
A paz tão sonhada da mulher, do homem,
de quem ama.
A paz do amor livre,
regada em doses de compreensão e entrega.
Duas partes a formar um todo.

A taça repleta de vinho
a adocicar o paladar
no estalar da língua
e no gotejar das minas do pensamento.
Nascente inesgotável de água para a vida.

Água virgem
Véo natural do tempo
Sangue do mundo
A escorrer pela terra e para a terra
Clara e transparente como o amor.

O amor
Esse pode tudo
E é por ele que se vive
Se justifica por si só
Se qualifica por só ser
Sem acessórios, sem adereços
Sem complementos, sem endereço.

O amor só pelo amor
Completo em si
Transcendente, sem materialismos
Espírito de luz e cor
Alma e corpo em luta de amar.

Um sonhar de dois
Olhos falando segredos
Gestos dissimulados,
a dizer tudo
sem pronunciar palavra.

O amor tudo entende
Sua chama nunca apaga
Também nunca queima
Nem dói.
Dói. Mais sem doer.

É como disse o poeta:
         AMOR....    é fogo que arde sem se ver
                            é ferida que dói e não se sente
                            é um contentamento descontente
                            é dor que desatina sem doer.

Parafraseando o poeta:
         O AMOR... se auto flagela
                            se auto ajuda
                            por si só se cura

                            se vencido, é vencedor
                            se no abismo, o mesmo amor
                            pelo amor, sobe às alturas.

E enquanto não chega o imprevisível
tempo
de partir para o innevitável,
a vida segue.
Dos dois se fará um
Nesse universo de sol e mar.

A base será sempre o amor
Cumplicidade sem culpa
Realidade em cor de criança
Beijo de pétalas a bafejar o espírito
pelo espírito.
A carne queimando em desejo
Também é amor
Ardente
Na química do dois em um.
E o um só tornará em dois
Quando vencida a fronteira do desconhecido
Em busca dos jardins dos céus
Na eternidade do tempo sem horas.

É o novo tempo
A continuidade desconhecida da existência
A nova vida
Do divino amor.

Para trás, tudo
Menos o amor
Está no ser
E o ser é o espírito
E é tudo o que resta
         O espírito que é amor
         O amor que é espírito.


Roberval Silva

SE AVEXE NÃO - Roberval Silva


Se avexe não
A canção já disse um dia
Que o caminho se fechou
E chegou lá quem nem ia

Se avexe não
A saudade apertou o peito
O sol veio e já se foi
E tudo está do mesmo jeito

Pra ir nessa estrada e chegar
Seja grande ou pequeno
Lavrador ou seu doutor,
Tem mesmo é que suar

Pra esse caminho finalizar
É preciso suor, muito suor
Mas é preciso mais ainda seu doutor
Muito amor, mais de amor, tudo de amor
Vencer qualquer espécie de dor
Sinônimo do dom de amar

Se avexe não
Ter coração bom não é não se afligir
Ter força no peito não é a vida agredir
 O meu cão me ama tanto e nem sabe falar

Se avexe não
O titanic afundou, sucumbiu um império
Um filho de carpinteiro se fez em eterno
Se avexe não...imprescindível é amar.


Roberval Silva

PAISAGEM DO MEDO - Roberval Silva


Esta é minha realidade
É assim que preciso ver
Assim que preciso agir
Assim tenho que viver

Não posso fugir do medo
O meu medo é um outro ser
Um ser que está em mim
Um ser que não vou vencer

Não posso fugir do medo
O meu medo é minha sina
Sina do medo, um enredo
Que o medo a mim se destina

Vencer o medo seria
O mesmo que vencer a mim
Vencendo o medo, me venço
Serei vencido de mim

Então ao invés de vencer
Preciso o medo enfrentar
Saber c’ ele conviver
Junto a ele caminhar

Conhecer a tênue linha
Entre o medo e a coragem
Um começa, outro termina
E equilibra a paisagem.


Roberval Silva

O PARTIR ANTES DO TEMPO - Roberval Silva


Às vezes penso
Que a razão do existir
Que o chegar e partir
E o segredo de tudo, até mesmo o ir e vir
Está nos porquês?
Penso e repenso até o mundo ficar tenso
Inclinado, descaído, pendido, penso...
Penso, só penso!
Mas não me atrevo a dizer.

Porque se vem, porque se vai?
Porque que vem quem nada tem?
Por que um ser se detém antes mesmo de nascer?
O porquê de se ficar tão pouco tempo aqui
O porquê de se passar tanto tempo sem medida
Na subida desta vida sem este sol merecer.

Penso também que é porque não existe um por quê?
O porquê é só um ser mais enigma que razão
Não um ser, uma equação que se vai a resolver
Que ninguém conhece a fórmula,
Que não perece, renova, sem nunca ao seu fim chegar
Qual romeiro em romaria pelo caminho sagrado
Que segue desarvorado só com o instrumento da fé
Novena que só rezando faz um milagre danado
Sem nada ser explicado, sem porque, sem paramento
Mas que segue devorando
Homens, sonhos, pensamentos
Semeando contra o vento a planta do bem virá?

Porque se vai pela estrada sem ter chegado a sua hora?
Tanta dor deixa pra trás, tanto sofrer... Oh! Tormento!
Quanta saudade a encher o existir do meu peito
Angústia que quase mata que é um tanto doer!
Que não explica, se sofre,
Que nada entende, só sente
Que não quer este presente que a vida lhe fez herdar
Quer até recomeçar, mas não tem forças... é inclemente.
O sangue de um inocente que o inevitável levou
O cálice que derramou antes do seu transbordar
Como entender o porquê da vida interrompida
Sem um motivo aparente, sem a razão se mostrar.

Penso que é por quê... Não sei dizer o porque
Talvez nem tenha porque, talvez tenha.  O que fazer?
É o mistério da vida que segue pregando peças
Não deixa aresta nem brecha para um porque indagar
Só nos resta o consolar compassivo de meu Deus!
Oh! Deus de misericórdia! Deus de bondade infinita!
Já que sofri esse golpe que não pedi pra sofrer
Dê-me forças pra viver... pra vida continuar
Cubra-me com o teu amor, com tuas bênçãos Senhor
Mostre-me o prosseguir, me guie com o seu olhar
Sou só dor, sou um ser andante que se perdeu no caminho
A força deste destino eu não queria viver
Mas se me deste é porque me conheces mais que eu
Vais saber como amparar seus filhos que estão perdidos.
Senhor Deus, me dê motivos e me livre de morrer
Nos oriente a encontrar a razão de estar aqui
Eu não sei mais nem porque estou a sofrer assim
Porque os tirou de mim? Porque nos deixou tão só?
Meu Jesus! A tua benção, tua guia e proteção.
Ensine-me a não morrer, dê-me os porquês do ocorrido
Porque que me tens nascido pra suportar tanta dor?
Meu Senhor! Só o teu amor pode enfim me redimir
Ajude-me a persistir nesse caminho de morte
Dê-me um norte que preciso o teu amor encontrar
A vida continuar, nova razão existir
Meu Jesus! O teu perdão! Que essa cruz que te chagou!
Seja a mesma a me valer pra tua luz eu seguir.

Que eu possa um dia entender que assim é que tinha que ser
Que tudo valeu a pena e que nada foi em vão.
Amém Senhor! O teu perdão!


Roberval Silva

sábado, 9 de fevereiro de 2019

JOVENS - Roberval Silva


Nosso direito de sonhar
É nossa razão de viver...

Rebeldes mas não sem causa
Na decadência do ter
À busca de um bem maior
Os neurônios a ferver
Não queremos só favores
Vamos a amadurecer
Ter garantias, direitos
Muitas fronteiras romper
Nosso direito de sonhar
É nossa razão de viver!

Preservar nossa inocência
Em paz sempre amanhecer
Fadas e papai noel
Presentes no nosso ser
Não agridam nossos sonhos
Não digam, vão se... arder
Saibam que os anos jovens
É que nos fazem crescer
Nosso direito de sonhar
É nossa razão de viver!

A nossa inconsequência
É da idade, a saber
Nossa santa ignorância
Não tem que sempre ceder
Mas no mínimo repreendam
Com respeito e vão ver
Que chamamos a atenção
Mais é só pra convencer
Nosso direito de sonhar
É nossa razão de viver!

Não queremos ter razão
Queremos só desdizer
O que foi sacramentado
Antes mesmo do nascer
De que o jovem é problema
Que nós não temos querer
Que nós não temos verdade
Não vamos emudecer
Nosso direito de sonhar
É nossa razão de viver!

Quando digo aos meus pais
Eu não pedi pra nascer
Não é só a rebeldia
Que impregnam o meu ser
È o não ser entendido
É o não nos compreender
É não nos dar atenção
E assim nos desconhecer
Nosso direito de sonhar
É nossa razão de viver!


Roberval Silva

O FIM DO MUNDO - Roberval Silva


O som ensurdecedor do trovão ressoou na imensidão azul do céu plúmbeo de medo. E o relâmpago, em raio eletrizante e cintilante, escorreu deslizante na abóbada em mistério anunciada, se perdendo no negro azulado da distância. A atmosfera cerrou as portas e o céu abriu suas comportas, inundando impetuosamente a noite em torrentes de terror e desespero. Escuridão era o que havia. Escuridão de uma noite sem luz e sem lua. De estrelas ausentes, apagadas no imaginar do escuro e de sonhos preocupados na inocente perspectiva de ver ali o mundo acabar.

A profecia se cumpria sem preparo e sem cerimônia. O fim chegava desavisado e não mais havia tempo nem mesmo pra falar de amor. Gritos se ouviam em todas as direções. Gritos de desespero e de impotência frente ao fenomenal evento. Uma desordem geral ordenou no mesmo ambiente e espaço todos os seres, revelando uma harmonia inexistente nos tempos da normalidade. Homens e mulheres se juntavam a leões e outros mais bichos, sem se incomodarem. Crianças escalavam dragões e serpentes, na inocência incomum de ambos, sem perigo algum. O ondular das ondas feria o espaço vazio com sua lâmina líquida e aterrorizante, vencendo quaisquer obstáculos, seja de gente, bicho ou outra qualquer natureza, se arremessando ferozmente sobre tudo, devorando sonhos, pensamentos, vidas e histórias, sendo história viajante em viagem de céu. Volumoso corpo aguacento, vivo e adjacente, num surdo rumor de riso e raiva, subindo vertiginosamente pela estrada aberta e larga que só se estreita nos limites dos céus. A natureza fechou seus olhos e se entregou, caindo por terra que nem terra mais é, levantando desta todos os filhos da luz ou trevas, levados igualmente e impiedosamente ao destino da viagem última. Consumado está o que não mais se pode remediar. O que foi é o que é e o que é pode ser o que não será.

O surpreendente de tudo, de todo este imensionável evento é que, mesmo no fim, a vida não acabava. A vida, quando chega ao fim, ainda é, em si, um ser existente. Ela se renova, transfigura-se e habita galáxias desconhecidas da terra a tão largos anos luz distantes, pelo espaço de um instante. E galáxias e outras mais galáxias se encheram de vida. Da vida que a terra renegou por não mais suportar. Se encheram da vida que não mais podiam aqui continuar, mas, que não estavam prontas, aperfeiçoadas para ao destino final e último chegar. E assim, vão por aí, habitando galáxias e mais galáxias até atingirem o último estágio da existência. Morrendo e recomeçando, em nova vida inserida, desconhecida de todos a nova vida investida, mas que é o caminhar lento, cortante e necessário para o aperfeiçoamento total enquanto ser, enquanto ser existente vindos do amor maior, vindos do seio do seu criador, por amor, e que se desvirtuaram por pouco quererem entender do amor que os trouxe à existência e então, penalizados estão, sentenciados a habitarem, de vida em vida, o desconhecido, até se conhecerem e se entenderem enquanto seres de amor que são, e, assim, alcançarem, pelo dom do amor, pelo dom do saber amar, o reino prometido lá no seio daquele que um dia por aqui caminhou e plantou com todas as letras e com o adubo da verdade, a razão da sua vinda e sacrifício. Lá no seio daquele que, se dirigindo a todos, indistintamente e indiscriminadamente, disse em tom de sabedoria e de santificação, a verdade maior: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vai ao pai senão por mim”.


Roberval Silva

LUA DOS AMANTES - Roberval Silva


                                              O novo quando vem...

Uma cantiga de vento enrubesceu os amantes
E na moldura viajante dos olhos
A noite vinha lá do fim do mundo

A lua se escondia na brancura da nuvem
E na sonoridade da alma
Um silêncio se ouvia
Um silêncio de fazer cantar os mudos

O som do amor se encarnou por toda a luz
E todas as bocas disseram o provar de corpos em êxtase

Um uivo abafou a imensidão da distância
E o prazer aquiesceu a alma enamorada

Os desejos ardem, convulsões desenfreadas
Sensações que se revelam
Na rima solta do verso

O ar cansado desmaia
Num respirar lento e cortante
E a forma disforme se renova
No formatar novo do novo.


Roberval Silva

INSENSÍVEL DESTINO - Roberval Silva


Essa é a banda de chão onde meu pai se enganchou
Depois que ele ali chegou nunca mais pôde sair
Plantou ali sua sorte no seio da terra bruta
Findou seus dias de luta quando estacionou ali
Sentiu sem saber que ali era sua última parada
Não mais teria o alento de outro chão procurar
A força mística do tempo fechou pra ele suas portas
A força torta que faz tudo direito ficar

Ele arvorou nessa terra, plantou tudo que podia
Plantou seu dia, sua noite, seus filhos, sua mulher
Plantou sua sina de ser ali seu começo e fim
Fez crescer nele a ilusão de ser ali seu mister
Não mais teve um outro norte, tudo ali se resumia
Quando distante se ia, era umas léguas de lá
Voltava no mesmo rastro, não se sentia seguro
No imaginário, seu muro, não podia ultrapassar

Ele tanto trabalhou, lavrou cacunda de pedra
Terra de areia lavada, terra boa de lavrar
Terra bruta, desalmada, que a enxada não cortava
Terra que até então ninguém ousava lavrar
Terra que só de olhar já se via o fim do mundo
Terra que não se indicava nem pra o inimigo morar
Terra de sol, sem aguada, sem vida, terra de terra
Terra que só tinha um fim, seu corpo ali sepultar

Meu pai levantava cedo, fazia o sinal da cruz
E caminhava pra lida tão feliz que até doía
Estava ele no dia antes do sol clarear
Isso quando tinha sol, que o céu de lá nem se via
Era um tempo de agonia, que lugar mais assombrado
Nem sol de dia, nem lua de noite, só escuridão
Uivo de fera bravia na distância de dez braças
Meu pai pronto a enfrentar, ali ele era um leão

Nunca vi tanta energia, que destino mais cruel
Tinha que beber o féu e era feliz o meu pai
Trabalhava, trabalhava, um trabalho sem retorno
Só ele via o soldo, nunca reclamou um ai
Trabalhava, se matava, suava as horas do dia
Todo o tempo só se via ele a terra labutar
De carpir a derrubada, roça de toco, queimada
Lá estava ele na foice, no facão, a augurar

Parecia num agouro a predizer seu destino
Mas era só a missão dada a um homem comum
E meu pai vestiu sua cruz, era sua, ele levava
E se fazia feliz sem ter conforto nenhum
Sua fé nunca abalou, que força descomunal
Ele era um homem de reza, de oração e de louvor
Na enxada, no sol quente, rezava a Ave Maria
Nosso Jesus, O Pai nosso, nosso Deus, nosso Senhor

Mas mesmo sabendo todos ser neste chão o seu fim
E condenando meu pai a uma morte anunciada
Meu pai nunca se entregou, nunca se desalegrou
Era a vida mais feliz que este lugar habitava
Era um mundo de alegria o olhar terno de meu pai
O pai da serenidade a perseguir a esperança
Esperança a lhe brotar no cantar de um passarinho
Jeito manso e compassivo, um sorriso de criança

Talvez se tivesse ele outras terras encontrado
Não era assim tão feliz como nesse fim de mundo
Tinha algo de encanto esse encontro inusitado
Meu pai e essa sua terra, o primeiro sem segundo
Vê um separado d’outro era inimaginável
Meu pai amava esta terra e ela o venerava
Ela até correspondia lhe dando tudo do nada
Era sentido aos olhos como um ao outro amava

Meu pai era essa terra e ela era o meu pai
Eram sim, inseparáveis, por uma força incontida
Força que não vinha dele, nem dela, força fadada
A força de uma chegada com requintes de partida
Compreendi todo o destino que este chão encerrava
Esse chão é do meu pai e do meu pai esse chão
Fez nesse chão sua sina de agora e para sempre
Aqui plantou sua história e também seu coração.


Roberval Silva

CONSTATAÇÃO - Roberval Silva


           O sistema político no nosso Brasil, desde os primórdios, é o meio e o caminho mais fácil para o enriquecimento ilícito dos seus praticantes. 
            Infelizmente, isso é uma herança cultural e, tantos outros, que ao longo do tempo, criticaram o sistema; ao chegar lá, fizeram tudo do igual, fizeram o mais do mesmo. 
        Confesso que sou um pouco descrente com uma alteração desta realidade. As discussões a respeito do tema que se tornam públicas quase sempre são instrumentalizadas para a promoção pessoal dos seus protagonistas. Que pena! Queria acreditar que é diferente. 
      Mas, mesmo na descrença, é preciso acreditar. Vamos acreditar, pois ainda existe, tenham certeza, uma centelha de esperança em nossos rostos e corações tão surrados pelas decepções.  

Roberval Silva                                         

ENCONTRO - Roberval Silva


Eu ainda pensei em desistir
Quando as forças quiseram me deixar
E acuado e sofrido percebi
Que desistir era o fim antecipar
Era o fim chegando antes da hora
Era o fim sem existir o recomeço
Sei que a vida detém os seus tropeços
E o momento oportuno é agora
De lançar todos os meus medos fora
E a vida de frente enfrentar

Eu que quase não soube reagir
Quando os dias quiseram se findar
E o caminho que eu não queria ir
Se abria à minha frente feito o mar
Revirei minha história de mil horas
Refazer o caminho não tem preço
Renascer pela fé é um direito
É entender que existe um Deus lá fora
Que é vivo e presente, aqui e agora
E o seu sonho ele faz realizar

Nosso Deus anda solto por aí
Procurando sua casa de morar
Ele bate, não deixe ele partir
Abra a porta que ele vai entrar
Entrará na tua vida sem demora
Cuidará seu espírito com apreço
Sai ar sujo e entra o ar fresco
Nosso Deus em sua vida agora mora
Ceiará com você destino a fora
E sozinho jamais te deixará

Encontrei as razões pra prosseguir
Quando vi e senti Deus me abraçar
Ele disse, filho, vai, estou aqui
E eu fui a andar bem devagar
Toda dor de mim se foi embora
Seu amor em mim eu reconheço
Se sua vida estiver do lado avesso
Creia e busque esse nosso Deus agora
Ele é sim e chegará em nova aurora
Esse Deus que é vivo e sabe amar.


Roberval Silva