Eu
sou janela pra ver
O
lado fora da vida
Eu
sou a dor diluída
Para
nunca mais doer
Eu
sou a água a ferver
Sou
o gatilho apertado
Sou
o prego enferrujado
Sou
ferrão de escorpião
Sou
a verdade de Adão
Sou
os quatro cantos do dado
Eu
sou a fonte que canta
Eu
sou a morte que cala
Sou
a estrutura da escala
Sou
morto que se levanta
Eu
sou a fome na janta
Sou
gume de canivete
Sou
a goma do chiclete
Sou
as cores do pavão
Sou
o estrondo do trovão
Sou
a lâmina do pivete
Eu
sou a xêpa da feira
Sou
o começo da vida
Sou
inocência perdida
Sou
pedra de baladeira
Sou
a metade inteira
Sou
a boca do alçapão
Sou
carro na contramão
Sou
a vírgula da história
Sou
insensatez na glória
Sou
sensatez no perdão
Sou
medo na noite escura
Sou
portentoso veneno
Sou
desnível do terreno
Sou
a santa santa e pura
Sou
cravo de ferradura
Sou
coceira na ferida
Sou
uma onça parida
Eu
sou fio da navalha
Sou
o sangue na batalha
Sou
cutilada doída
Eu
sou cigarra vadia
Sou
reta na encruzilhada
Sou
golpes de navalhada
Sou
a face negra do dia
Sou
a treva que alumia
Sou
a luz que se apagou
Sou
porta que se fechou
Sou
janela escancarada
Sou
rasgo de cutilada
Sou
o escuro que clareou
Sou
o calcanhar de Aquiles
Sou
a espada de Heitor
A
honra de Eleanor
Dos
Basílios, sou “Basilis”
Dez
livros de “Pitigrillis”
Sou
o silêncio no sermão
Bomba
no Afeganistão
Sou
guizo de cascavel
Sou
a torre de Babel
Sou
empregado e patrão
Eu
sou pimenta de cheiro
Sou
a malagueta ardida
Eu
sou chegada e partida
Sou
o filho do carpinteiro
Sou
o juro do doleiro
Sou
o rascunho da mente
Sou
o nascer da semente
Sou
terça de carnaval
Eu
sou o bem e o mal
O
lodo e a água vertente
Sou
a areia da ampulheta
Eu
sou a cruz da espada
Sou
bomba atômica testada
Sou
a cura da maleita
Sou
elixir na colheita
Sou
o ataque do leão
O
dente do tubarão
Sou
a lembrança esquecida
Sou
a larva derretida
Sou
o buraco no chão
Sou
labareda de fogo
Sol
o sol do meio dia
Sou
a dor da agonia
Sou
princípio e fim do jogo
Sou
pressão e desafogo
Sou
a prosa e a poesia
Sou
tristeza na alegria
Sou
a marquise arqueada
Sou
o fim da caminhada
Sou
o doce raiar do dia
Eu
sou lagarta de fogo
Sou
a reta que se inclina
Sou
os desejos da menina
Sou
milagre vindo a rogo
Sou
Iago, Jacó, Diogo
Sou
todos e sou nenhum
Sou
vôo penso de anum
Sou
vento no milharal
Sou
calma no vendaval
Sou
a fome no jejum
Sou
torto que se endireita
Sou
regra desafiada
Sou
lei não executada
Sou
resto de coisa feita
Sou
mulher que não se enfeita
Sou
reza dita sem fé
Sou
carro de marcha a ré
Sou
a abelha e seu mel
Sou
o amargor do fel
Sou
enchente na maré
Eu
sou a estrada sem fim
Sou
o infinito que se acaba
Sou
o leite da mangaba
Sou
o pavio, o estopim
Sou
aroma de alecrim
Sou
o burro do oleiro
Sou
a colher do pedreiro
Sou
a praga na invernia
Sou
a verve da poesia
Eu
sou a cruz do madeiro.
Roberval Paulo
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