No
fundo do mar, bem lá no fundo, no lugar encantado do mar existe casa. Casa
mesmo, de verdade; casa de tijolos e telha, casa seca, com móveis, colchão
macio, geladeira, fogão, churrasqueira; é, dá até pra se fazer churrasco. Tem
chuveiro quente, varanda... quintal com árvores, flores e pardais.
É
lá que habita a sereia do mar. Quando desencanta, é claro. E lá ela é mulher de
verdade, a mulher mais linda do mundo, e com duas pernas, igual as das outras
mulheres e com tudo o mais de mulher. Lá ela não tem calda de peixe não. Lá ela
é mulher de verdade, de verdade mesmo e que sabe tudo de amar e de amor.
Bobo
que não sou, é lá que eu quero ir; é lá que eu quero chegar. Só aguardo a
aparição da sereia pra me mandar daqui e seguir com ela. Quando ela aparece, te
atrai. E se te beija, você se encanta com ela e aí, não se afoga, pode ir no
fundo do mar até a casa da sereia. E lá, depois do encanto, você será um homem
feliz e terá do seu lado a mulher mais linda do mundo e também o seu amor.
Felicidade eterna, posto que lá não se envelhece. Lá o tempo não passa, pois lá
não se vê a luz do sol. Tudo debaixo do sol passa, porém, lá é diferente. Como
não é iluminado; não é alcançado pela luz do sol, essa morada fica imune a ação
do tempo.
Só
existe uma situação em que tudo pode mudar. Não se pode perder o amor da sereia
amada. É diferente da vida aqui, acima das águas e debaixo do sol. Ela precisa
estar apaixonada sempre. E para isso, tu precisas lhe devotar todo o amor do
mundo, amá-la todos os dias e noites, satisfazer todos os seus caprichos e
desejos, dedicar todo o seu tempo de
vida à sereia amada. Ela, realmente,
precisa estar sempre apaixonada, porque senão, desfaz-se o encanto. Se ela se
desencantar de você, ela se veste de sua calda de peixe e vem à praia seduzir
um outro amor. E se isso acontecer, você já é passado pra ela. E como a vida no
fundo do mar; a vida de casa de sereia é imune a ação do tempo pela ausência da
luz do sol, isso quer dizer que lá o passado não existe, e, consequentemente,
você também não mais existirá, desaparecendo como que em um encantamento,
extinguindo-se na imensidão das águas, que, por sua vez, notícia alguma darão
de ti, sendo o seu fim eterno, sem direito a uma nova chance.
Então,
em se encantando e se enamorando dela, não perca o amor da sereia amada; não dê
motivos para que ela venha a deixar de gostar de você. Sede fiel e único em sua
vida e assim a terá por toda a eternidade, pois o amor verdadeiro jamais
morrerá. O amor perdura por toda a vida, seja lá, seja cá, e, uma vez perdido,
despedaça, e, despedaçado, seus cacos nunca mais se juntarão, tanto lá, como
cá. Então, seja o seu amor sereia ou mulher; seja lá ou seja cá, ame-a com
todas as suas forças, e lealdade, e amor, e dedicação para não vê-la partir,
pois, assim acontecendo, na sua partida, tanto lá, como cá, se dará o
desencanto, o desencanto do amor e aí, será tarde, porque, com ou sem a ação do
tempo, o gatilho apertado não trás mais a bala de volta. É assim no amor. Uma
vez perdido, a estrada se torna triste e você, sozinho, e, sozinho, é nada e o
nada se extingue, seja nos segredos do espaço ou no mistério das águas,
passando a ser só saudade. Saudade sabe, daquelas que não se vê e não se toca,
só se sente. Sentimento inaudível, inexplicável, insolúvel, só sentimento. De
sentir e de doer, enquanto o tempo, tanto lá, como cá, se esquece das horas; se
esquece de si próprio e acelera sua marcha rumo ao incerto e sabido, o único
mal... ou bem... irremediável, que amarga a face do nosso destino sobre este...
ou outro mundo. Não vou mais querer ir à casa da sereia.
Roberval Paulo