segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

CANÇÃO DE LUAR - Roberval Silva


E a lua cantando um canção, oh! chão

Quem dera pudesse eu pisar-te, tocá-lo

Sentir o teu calor, beijar tuas entranhas

Me derramar em prata sobre teus montes e rios

Embriagar-me no verde das tuas matas

Quanta beleza, oh! Deus, longe desse céu.



Roberval Silva

CAMINHANTE - Roberval Silva


Se me perco, és o meu encontro

Se me escondo, sou o teu achado
Se me despenco, tu me tens ao colo
Se me vejo só, estais ao meu lado

Se choro, és tu o consolo
Se estou triste, me dás alegria
Se me sinto pobre, tu és meu tesouro
Se me falta luz, és tu o meu guia
                               
Quando canto, és tu a canção
Se tenho frio, tu és o abrigo
Se me apaixono, és minha ilusão
Se estás comigo, já não há perigo

Se sou o fim, tu és o começo
Se sou o começo, és tu o meu fim
Se choras, se sofres, sou eu quem padeço
Se tens alegria, alegras a mim

Sou labirinto, tu és a saída
És flor na minha vida, sou o teu jardim
És enfim, meu oásis, sou eu, do deserto
O caminhante, ao certo, tenho a ti, tens a mim.

Roberval Silva

BRINCANDO DE SOL - Roberval Silva


Sol dourado, de ouro, alaranjado
Sol amarelado, de ouro, encarnado
Sol cinzento, de ouro, com ungüento
Sol sonhado, de ouro, encantado

Sol quimera, de ouro, é primavera
Sol forjado, de ouro, pelo outro lado
Sol desterra, de ouro, sal sobre a terra
Sol asado, de ouro, desgovernado

Sol chumbo, de ouro, a virar mundo
Sol azul, de ouro, chuva no sul
Sol mundo, de ouro, vai-se Raimundo
Sol igloo, de ouro, no polo sul

Sol triste, de ouro, dedo em riste
Sol ferido, de ouro, oh! que perigo
Sol vermelho, de ouro, eu vi primeiro
Sol de trigo, de ouro, de pão me viro

Sol augusto, de ouro, levei um susto
Sol tangente, de ouro, incandescente
Sol restrito, de ouro, vamos ver isto
Sol plangente, de ouro, também semente

Sol triunfante, de ouro, poesia, Dante
Sol enfumaçado, de ouro, turvo, cansado
Sol contagiante, de ouro, no céu, cortante
Sol esbranquiçado, de ouro, lânguido, cansado

Sol freemente, de ouro, sonho dormente
Sol do amanhã, de ouro, febre ter sã
Sol proeminente, de ouro, tom veemente
Sol atemporã, de ouro, corrida vã

Sol, um marco no tempo, andar
Sol, princípio da vida, a flor
Sol, de todos os dias, sonhar
Sol, razão de um tudo, AMOR!


Roberval Silva

ALMA-TERRA - Roberval Silva


A carne da terra
É a terra
E a ela se vai
Toda carne
Carne-terra

O sangue da terra
É a terra
E a ela se vai
Todo sangue
Sangue-terra

A alma da terra
É a vida
E a ela se vai
Toda vida-matéria

E a alma sobe,
de terra
Para alimentá-la do espaço

Alma-terra
Vida que não morre
Luz que nunca se apaga.


Roberval Silva

A VOLTA - Roberval Silva


                  Ao mestre Mário Quintana



Avistei ainda de longe
                  as primeiras casas
Os campos conhecidos
         chegavam-me aos olhos
Um pouco diferentes
Mas com a mesma familiaridade

Entrei na Avenida Principal
As casas pareciam cumprimentar-me
Muros sorriam
Estavam com saudades
Paredes novas e retocadas
Portas e janelas
                  de caras novas

Pisei o chão da minha rua
Eles me saudaram
Um olhar asfáltico

Entrei na casa da minha
                                     infância
Acordando minhas lembranças
                                     todas verdes
Elas receberam-me, em festa
                                     e maduras
E com um sorriso amarelo
Reclamaram tamanha ausência

Sorri de lágrimas nos olhos
Chorei de sorriso nos lábios.

Roberval Silva

domingo, 27 de janeiro de 2019

CAMINHAR DE NUVEM - Roberval Silva


Não sei em que dia me encontro ou em qual noite descanso.
Tudo é como as águas de um rio que descem caudalosas e cautelosas e nada as detém.

Sou feito o sol escondendo-se da chuva e só voltando quando esta já partiu.
Fugir da vida não posso.
O chão que me espreita é paciente pois tem em si a certeza que me terá um dia.

Não fujo do encontro, só retardo o que certo é.
Ela vejo em sonho e seus cabelos e olhar me dizem amar.
Fecho os olhos e sua visão faz-se mais nítida.
Estamos do lado oposto da hora.
Não sei em qual órbita ficou guardado o nosso encontro.

Espero pacientemente e caminho na direção contrária do medo, pois tenho em mim a certeza que o nosso dia chegará.

Roberval Paulo

DA GERAL - Roberval Silva


DA GERAL, observo a vida passar por mim na direção do desconhecido e me posiciono como se fosse um imã para que a vida possa em mim grudar e não mais fugir.

E assim, encho-me e recheio-me de vida, seguindo com ela a estrada da luz à procura da morte que, viva, me pede perdão e se esgueirando feito cachorro vadio, grita por socorro ao se entender morta.

Eu, vivo, observo tudo em silêncio e não posso disfarçar uma lágrima clara e fria que escorre pela minha face ao compreender que o grande segredo da existência é o que inexiste e a porta de saída para a próxima vida é o encontro com ela: a mãe que a todos acolhe e a ninguém rejeita.

Meus pensamentos caminham desordenados e inquietos pelos labirintos do medo e transportam meu ser à legião de um sonhar desesperado, sabendo esse desespero ser a esperança em sua mais perfeita tradução, pois que a vida ainda está por aqui e, DA GERAL, ainda observo a passar por mim o cortejo fúnebre que ora vivia e que segue ao destino do fim que é, e será, nada mais, nada menos, o começo de tudo.


Roberval Silva

O QUERER-TE - Roberval Silva


Gosto de querer-te
                           em mim
Gosto de ver-te
                           assim
Completamente solta
Alheia a tudo

Ao vento
         Que lhe lambe os seios
Ao sol
         Que lhe doira a pele
À lua, que te invade
                           e te cultua

À mim,
         que de tanto ver-te
Mais de amor te quero.

Roberval Silva

NO TERCEIRO TEMPO! - Roberval Silva


Já pressinto, sei que está chegando a hora
Ninguém se entende, este mundo é só baderna
É muita guerra, uma fome arrasadora
O descaso versus a cidadania
                                                                      
A miséria já é um mal necessário
E o povo sem saída só espera
Que venha o corte desse mar de privilégios
Que favorece uma influente minoria

E que do mar, pelo vento, venha a ventura
Em ondas de paixão, espelho da vingança
E sobrepujando a terra, desfaça a abastança
Diluviando a luz neste sol de amargura

Que no rumor das torrentes, se igualem as diferenças
Sem distinção de cor, de raça ou de patente
Operário, sem salário, general ou presidente
O mesmo peso e medida ante o credo e sua crença

A aroeira dobrará qual ramo de trepadeira
O leão, símbolo da força, perde o poder tal qual Nero
Todos os olhos a chorar sem desvendar o mistério
A força bélica do mundo, mais um brinquedo de feira

O sol se pondo não mais nascerá
Não haverá mais lua, nem noite, nem dia
No tempo não mais terá o tempo da cronologia
As horas não passarão e o vento não mais soprará.

Roberval Silva

SABEDORIA - Roberval Silva


As pessoas boas recordo meu avô
Uma lembrança perdida
Que não a alcança os olhos
É a memória que viaja
Pelo passado dos meus verdes dias
O presente tão sem cor
Que quase só de memórias sou feito
E o passado não roda moinho
Mais roda o tempo ao revés
Trazendo-me pelo tempo
A criança que um dia fui
E o meu avô, seu braço forte
Seu olhar severo, seu coração mole
Seu jeito de encantar
Ele era tão criança
E me disse no meu tempo de menino
Vai pela vida meu filho
Que esse mundo é todo seu
Plante o amor
                   e colherá a paz
Plante a certeza
                   e colherá a realização
Plante a vida
                   e colherá a vida eterna
E sede como a água meu filho
Corra sem parar
Corra mesmo sem ter onde chegar
Corra mesmo sem saber onde vai dar
O que importa se o fim da corrida é a terra... ou o mar?
O importante é semear
A essência da vida por onde passar

Que a vida lhe seja em excesso
E que o mar “mundo” esteja feliz
com a sua chegada.

Roberval Silva

PRUDÊNCIA! - Roberval Silva


Vamos ao evidente
não passemos dele
Situe-se no ponto de partida
e se posicione
Abertamente, na diplomacia
sábia filosofia
Incerteza? Não aconteça
PARE! Precaução
O sim é o encontro
Aí, SIM!
O sol a clarear
a dúvida se esvaindo
Prudência do eterno caminhar.

Roberval Silva

PRODUÇÃO - Roberval Silva


Todo sol tem seu perfume
Toda flor o seu espinho
Todo dia a mesma noite
Todo amor tem seu carinho

Todo poder seu comando
Todo fogo a sua chama
Todo recuo um avanço
Todo sonho a sua cama

Todo prazer sua dor
Todo homem a sua cruz
Toda moça o seu amado
Toda mãe o seu Jesus

Toda tristeza o seu pranto
Toda alegria o seu canto
Todo senhor seu orgulho
Toda senhora o seu manto

Toda noite o seu mistério
Todo céu a sua renda
Todo enfermo o seu remédio
Toda compra a sua venda

Toda ida a sua volta
Todo caminho o seu rumo
Toda subida a descida
A produção, seu insumo.

Roberval Silva

PROCURA - Roberval Silva



Revirei meus livros e o meu guarda-roupa
tirei a poesia da vida e guardei-a
no chão do meu sonho.

Levantei o tapete
e lá se foram todos os meus guardados
levados vento afora.

Fechou-se a janela da memória
e os meus verdes engavetados
                                       amadureceram
no futuro do esquecimento.

Roberval Silva

PERSISTÊNCIA - Roberval Silva


A água desceu e o rochedo a cercou

Ela cavou... cavou... cavou... e passou

E não desistindo, venceu!

Tornou-se rio

E tornou-se mar.

O homem entendeu e deixou-a ir

E ela se foi

Senhora da vida.

Roberval Silva

VOAR - Roberval Silva


A leveza de um pássaro

             é o instrumento principal do seu vôo.

       Vôo alto e seguro

             a conquistar o espaço

                    infinito e desconhecido.

Roberval Silva

O SENTIDO MAIOR DAS COISAS - Roberval Silva


Marcenaria rima com maçonaria, mas nada tem a ver a rima com o sentido
São tão distintos como o são, ferro e berro
Mas se tu ferras, o bode berra
E se tu desces o ferro, o cabra solta o berro
Mas tudo depende somente da vontade de quem fez céus e terra.

O Marceneiro trabalha a madeira de lei, a madeira sem lei, depende do custo, do poder aquisitivo e do público que tem.
E esse poder tem o Maçom, eu sei
Que rima com garçom e é tão nobre quanto um Rei.
Mais pode também não ter, e daí? Ele tem uma lei
Qual? Eu não sei. É um mistério, um segredo
Tem até bode pelo meio; pacto, aliança, de sangue, de fé
Folclore? Talvez. Mais algo existe de misterioso no ser Maçom ou Marceneiro
Um, arte e ciência. O outro, ciência e arte.
Igualdade indiferente das diferenças iguais, pois, igual ou diferente, o que vale é existir.

O bode eu sei que berra, o marceneiro ferra
Mas quem ferra é ferreiro, esse merece um aparte; nem estava na história e já entrou ferrando Marceneiro e Maçom, e bode, mais não gente, que com gente é diferente, já dizia o cantador.
É diferente, acredito, mais são também, com certeza
Farinha do mesmo saco, a origem é uma só.

Bode, gente e marceneiro; Maçom, ferreiro e cantador
Uma confusão dos diabos que rima até com quiabo
Mais só um é alimento, o outro é padecimento, raiz do mal, eterna dor
E veio do criador, mais não cumpriu seus preceitos
Por isso, cuidado a eito, não queira ser o melhor

O Criador é um só e só, rima com amor
Tem tudo a ver o sentido com a rima e com o ser
É verdadeiro dizer, sede igual, não importa o ofício, o credo, a raça ou a cor
O sexo ou a natureza, animal ou vegetal, mineral, seja quem for
Sede igual nosso Senhor que mesmo sendo o menor, nunca deixou de ser grande
O único DEUS e maior é também pobre de Jó
E simples como uma flor a obra do Criador
A raiz da existência rima com inexistência
O espírito é a essência e tudo o mais matéria e pó.

E que DEUS perdoe os nossos pecados e nos conduza à vida eterna.
Amém!


Roberval Silva

NOTA MENOR - Roberval Silva


Caminhar
Sentir o vento no rosto
Bater de frente com a vida
Cair em sono profundo

Atropelar obstáculos
Passar por cima do sol
Dar duro desde a manhã
Viver conforme o seu ritmo

Ir longe no rol do tempo
O perto é tão sozinho
O porto não é seguro
A luz dos olhos não vê

Só vê o que está escrito
Convencionado no tempo
A luz das trevas não brilha
O fim do túnel é o fim

Começo de nova era
No despertar da razão
Desconhecida dos deuses
Desconhecida da vida
No fundamento da alma
Tocada em nota menor.

Roberval Silva

MÁGICO - Roberval Silva


Peguei meu amor com as mãos
E toquei, acariciei e beijei
E a senti toda minha
E a tive toda minha

Mas o momento passou
O momento mágico do amor

E lá se vão nuvens densas
Deixando presente a ausência

E viva, a saudade
De uma verdade mentida
Que voou com o pensamento
Me entregando ao sentimento
De minha vida sofrida.

Roberval Silva

O MENINO DO ESPELHO - Roberval Silva


O menino do espelho
O que vê? A sua imagem
Pra ele, desconhecida
Faz de cá uma careta
O menino, se assustando
Neste gesto simultâneo
É ele mesmo, o autor
Sem saber, inconsciente
Criador do personagem
Que muito nele se espelha
Mas que não chega a ser ele
É sua imagem, no espelho.

Ele agora dá risada
Passado o susto, o medo
Se acha até bonitinho
Não ele, o ser do espelho
Que lhe olha admirado
Leva o corpo pra esquerda
Outro gesto copiado
Êita! Risada gostosa

Um tapa, acerta o vidro
Mas que desapontamento
Sou em mim, só uma imagem
Um menino a contemplar
Outro menino que vejo
Mas não lhe posso tocar
Que bom fazer-lhe um carinho
O espelho não quer deixar
Uma cabeçada no vidro
Nossa, começo a sangrar
Ele também está sangrando
Bocas no mundo, buááá!
Ele por mim, eu por ele
Minha mãe vem consolar
Ele também tem uma mãe
Com a minha se parece
Olhe lá, já está sorrindo
Que malandro o safadinho

Vejam só, já está sumindo
Vai levando a minha mãe
Não, que a minha está aqui
Que bom que nós temos mães
Elas até se parecem
Ou melhor, são mesmo é iguais
Toda mãe é uma só
Toda mãe é a mesma mãe

Agora eu vou é dormir
Que colo bom é o de mãe
Amor-verdade é o de mãe
O espelho é que não tem mãe
Coitado, é tão sozinho
Mas tem aquele menino
O menino e a sua mãe
Que agora estão dormindo
Toda criança do mundo
No colo de minha mãe
No colo das nossas mães
Dormindo o sono dos anjos
No colo-berço do amor
Visto através do espelho
Que agora sorri, tão só.


Roberval Silva

LUZ DO INDECIFRÁVEL - Roberval Silva


Paredes de vento e concreto
Dor e prazer, agonia
Vida e morte, todo dia
Amor, paixão e desejo
A natureza do beijo
Autofágica sinergia
Florescer da anatomia
Carnes, e partes e formas
Momento, tempo presente
Cimento, sólido tear
Chão, vulcão e passamento
Rebentos, ondas geladas
Sensações desenfreadas
Química, corações e velas
Degelo, solar-lunar
Átomos das cores mais belas
O metafísico eclipse
Na geografia dos corpos
Mistério, chaves, segredos
Passíveis de desenredo
Sangue, nervos e magia
Explosão, disritmia
Possível punhal do tempo
Abismo de nostalgia
Bocas úmidas, gritos roucos
Labirinto de vontades
Revelando o inconsciente
Na luz do indecifrável.

Roberval Silva