sexta-feira, 4 de março de 2016

IDENTIDADE FILOSÓFICA - Roberval Paulo


A João Cabral de Melo Neto

A nossa identidade está na pedra
Na natureza da pedra
Na dureza da pedra
Na pedra que a tudo suporta e teme

A nossa certeza é a da pedra
Da pedra que por tudo passa
Da pedra que em mim abraça

Seu corpo ainda semente.

Roberval Paulo

O ATIRADOR - Roberval Paulo

O atirador mira... mira... mira...
Aperta o gatilho
Acerta o alvo
O coração
Fere
Depois sofre por ter desferido tiro tão certeiro
Tão mortal, fatal
Tão letal de morte viva.

Mas já foi, no não segurar das emoções
A bala não volta e
A ferida está aberta
O que fazer?

Redimir-se consigo mesmo e como punição
Não mais olhar para o Sol, nem para o Céu
Nem para as Estrelas, até penitenciar – se por
completo
E jamais voltar a desferir tiro
Tão carregado
Tiro tão carregado

                        de noite e de dor.

Roberval Paulo

ELE E O OUTRO - Roberval Paulo

Ele correu mais depressa que o outro
Mais na sua pressa, tropeçou e caiu
O outro, o sem pressa, passou e chegou
No meio do caminho a pedra “lhe” viu

Ele levantou, sacudiu a poeira
E se desembestou, sem rumo partiu
O outro estudou e traçou seu caminho
Ele tá perdido, o outro intuiu

E ele, na pressa, passou do destino
E ao passar a porta se fechou
O outro, prudente, alcançou a glória

Ele, cansado, sentou e chorou
O outro escreveu o seu nome na história

Ele, sem história, pela vida passou.

Roberval Paulo

DESPERTAR - Roberval Paulo

E ali, no seio da natureza
O verde me parecia mais verde
Cobrindo todo o anglo de visão dos meus olhos
E porque não dizer
Toda a imensidão da minha existência
Que se tornara nada diante de tamanha beleza.

E ali, no seio da natureza
Me fizera eu tão menino e tão pequenininho
Que quis até chorar
E lembrei-me de um tempo já passado
Antes do meu despertar
Flutuava em um leito de pura água e amor
E, inconscientemente, queria eu que o tempo não passasse
Energizava-me desse amor
Uma felicidade sem fim.

E ali, no seio da natureza
Vi que a natureza é a força superior
E me embalava na água, nas ondas que dão a vida
No leito daquele rio, daquele rio de amor
Era o princípio de tudo e o princípio era o verbo
Nas águas e o firmamento e o verbo era DEUS
Faça-se... Faça-se... Faça-se...
E fez-se a mãe natureza
E a natureza sou eu.

E eu ali, pequenininho, no seio da criação
Na imensidão das águas
Na imensidão da mata
Na imensidão das montanhas
Na realidade do chão
No meio de tanto amor
Eu, um simples pecador
Faço parte do conjunto
Sou madeira, terra, fruto
Sou enfim, parte da história
Por tua bondade e glória.

Amém!

Roberval Paulo

DE UM TRISTE SÓ MAIS NÃO SOZINHO - Roberval Paulo

Meu canto é demente, carente, incessante
clemente por teu amor
sorridente das mazelas do acaso
arvoredo sombrio
pássaro em desatino
canto em desalinho
         de um triste só mais não sozinho

E a vida encontra o meu canto
no deserto de um ser multidão
de vozes e sons caminhantes
murmurantes
à beira do caminho
na incongruência incongruente da pedra
sozinha, indo
ingênua confidente
         de um triste só mais não sozinho

Andante dos teus sonhos
amante da tua cor
te perdi na tangência do destino
te beijo na boca de quem passa
confidencio-te norte em meu caminho
rio do meu viver em confluência
para além
muito além da inocência
linha reta, inconstante
constante vida
quase inexistente na
existência em teu caminho

         de um triste só mais não sozinho.

Roberval Paulo

BREVE MOMENTO DE REFLEXÃO - Roberval Paulo

Só entro na poesia quando esta sai de mim
Eu a encontro quando ela me deixa partir

Aí reflito! E ela pensa comigo
E juntos, passeamos por um campo florido
Ela me agride bem no meu interior
E a resposta se vai em palavras
Palavras soltas, palavras tortas
Palavras, só palavras, sem nada a dizer

Aí, mais reflito!
O entendimento da poesia
Esta me ignora e me leva a voar
Povoa os meus sonhos, e medos, e segredos
Toma corpo e invade o meu mundo
Trás de volta o meu sonho no vôo de um pássaro
Percorre em segundos a larga distância do existir
E sua tinta se espalha feito sangue

Aí, ainda mais reflito!

Aí, sou poeta.

Roberval Paulo

quinta-feira, 3 de março de 2016

DOS GRANDES PRAZERES - Roberval Paulo

Os grandes prazeres da vida
São tão simples
                   como beijar um filho
Comer chocolate, por exemplo
É tanto prazer
                   que de tão bom
parece pouco.
Mas ninguém dá valor
                   nem importância maior
Querem mesmo é dinheiro
mesmo que neste
                  não se sinta sabor
E sim o prazer
                   de comprar o mundo
mesmo perdendo
                            o prazer maior,
                   de comer chocolates
                   de beijar seu filho
                   de sorrir com ele
                   de sonhar com ele
                   de mostrar-lhe o mundo
                   de mostrar-lhe a vida
e nele, fazer um afago

         e dele, receber um carinho.

Roberval Paulo

UM LOUCO DA VIDA - Roberval Paulo

Meu sonho está na estrada
Eu vivo um dia por dia
Eu rezo a Ave Maria
E sigo fazendo história
Sou de fracassos e glórias
Sou mesmo um louco da vida
Quero esta noite aquecida
Pelo véu do criador
Sopa de estrelas luzentes
Colchão de relva macia
Estou falando em poesia
Tenho um cavalo ligeiro
Asado, um cavalo alado
Que busca até pensamento
No peito do firmamento
No verde mar dos teus olhos
Tô na chuva e não me molho
Tenho sede de justiça
Estou um pouco cansado
Cadê o trem que não passa?
O santo que não me abraça?
Porque não começa a missa?

Meu sonho está na estrada
Eu vivo um dia por dia
Eu rezo a Ave Maria
E sigo fazendo história
Sou de fracassos e glórias

Sou mesmo um louco da vida.

Roberval Paulo

REFAZENDO - Roberval Paulo

Vou-me embora
Vou-me embora
Vou-me embora
Vou na frente

Vou correndo
Mas querendo
Andar bem mais devagar

Caminhando
Caminhando
Caminhando e conspirando

A favor da existência
Contra o sol da inexistência
Que é preciso mais ainda
Muito longe caminhar

Sempre em frente, rumo ao norte
Norteando
Norteando
Norteando e transpirando
Com Deus e a muito suar

Esperando pela hora
Enfrentando a ir embora
Acontecendo
Refazendo
No destempero do vento
Nas intempéries do tempo
Sem desviar da subida
Sem se empolgar com a descida

E o destino a desvendar.

Roberval Paulo

ANJOS QUE CHORAM - Roberval Paulo

A dor do estupro invadiu o seio de Platão
E a maldade dos homens se espalhou pela
humanidade sem nome.

E matou sonhos, feriu corações,
aniquilou vidas
e tingiu de um róseo negro
o azul de céu e mar.

A menina ganhou pirulitos de maçã
e subiu saltitante as escadarias do céu.

E o desejo e ainda o prazer
foram sepultados na estupidez
do homem sem cor. Um túnel sem luz!

Mais a alma, na sua pureza de menina
subiu ao céu
No seu sorriso, o pirulito de maçã
e a doce e terna alegria que só no céu se revela.

O cheiro de flor inebriou todo o céu
E as lágrimas dos anjos formaram
as torrenciais chuvas de outono.


Roberval Paulo

NOVELOS DE AMAR - Roberval Paulo

Ainda que de sol e mar seja eu feito sou e sempre
 serei igual a ti e a mim como se fôssemos
um só como se fôssemos todos em apenas um
 que de tão iguais somos até diferentes somos mesmo
 diferentes e de caminhar e sorrir nos vemos seres
 antes fosse dois ou mais ou todos e assim quero
 me perder em ti antes que em mim e sentir o doce aroma 
da vida extraída subtraída do meu ser quando 
o assunto é você e na vertente da nascente água da vida
 cingir de brisa e flor o frescor do teu corpo e alma
 e coração qual vulcão se vestindo de calor se contorcendo
 de dor não de dor mas de dor de prazer de querer se perder
 no valor do amor amor meu e teu e nosso se amando
 se dando doando a paz sonhada tão pensada idealizada
 e necessária às almas descentes carentes de tanto querer
 se achar se encontrar e seguir na rota da vida subir 
na descida por tanto lutar e descer ao seio de todo amor 
que amar é o princípio de tudo a razão deste mundo 
o porque de estarmos aqui neste sol faça chuva frio ou calor
 viver é sentir respirar sentir dor deleitar no perceber da glória
 construir a história vivendo infortúnios às vezes na lama
 em outras na cama a cair me levando contemplo me espanto
 me arranco em disparada tenho a alma asada de andar
 viajar conhecer se entender entender as gentes manter latente
 a chama viva da vida em mim e em ti em nós que ainda que
 de sol e mar seja eu feito sou e sempre serei igual a ti
 e a mim como se fôssemos um só como se fôssemos
 todos em apenas um que de tão iguais somos até diferentes
 somente um somente nós e a vida por nós a passar 
nos levando em novelos de enrolar 
desenrolar nossos sonhos que de tão amar juntos
 somos muito a sós entre nós a caminhar.

Roberval Paulo

ATITUDE! É PRECISO TER - Roberval Paulo

Eu gosto das boas atitudes
A atitude, por exemplo, de procurar dar casa a quem não possui,
A atitude de dar de beber a quem tem sede
De alimentar a quem tem fome.

A atitude de levar um sorriso a quem não sabe sorrir
De levar um abraço a quem já não mais abraça
A atitude de sonhar o sol, mesmo que este não se dê aos sonhos.

Quero luz e que a luz da vida esteja em todos
Que a vida seja farta e que na linha de chegada
Possamos partir rumo ao bom
Que o bom é viver.

Gosto de atitude, das boas atitudes
E de perder
Que ganhar é muito fácil.

E que de boas atitudes
Seja o mundo repleto
Seja a vida completa
De sonhos, de amor e de paz
De sol, de luar, de cantar
Na terra onde tudo é breve.


Roberval Paulo