Abri
os olhos naquela manhã e, pela janela, contemplei a linha negra do horizonte.
Era um dia amargurado e triste. O dia e eu em mesma sintonia. A paisagem estava
esburacada, cinza e opaca. Eu, sombrio e desolado. Ajuntei as forças que ainda
restavam em meu ser e busquei reerguer-me, contraindo os músculos, colocando-me
de joelhos e mãos na cama para impulsionar o meu levantar. A preguiça e o
desânimo manifestaram-se ainda mais fortes do que toda a força empreendida para
levantar-me e num golpe baixo do desalento, jogou-me estendido entre lençóis e
travesseiros num rumor surdo de um gemido triste e exprimido de quase não se
ouvir, mas tão intenso que chegava a questionar o valer a pena do existir.
Voltar
a dormir não mais consegui, mas, sonolento e angustiado, num misto de gente e
nada, replicava para mim mesmo, acho que querendo responder a uma indagação
ainda não proferida, o quão complexa é a vida quando a vida tão querida dá
mostras de ser vida não vivida e sim vida combalida em dor de não se aguentar.
É
a dor da perda mais uma vez reclamando o seu cativo lugar. Alcancei o
entendimento. A dor é cativa e conectada em mim como parte integrante do meu
ser, hei de aprender a conviver com a sua existência, transformando-a em quase
o meu próprio alimento e também em meu lenitivo. Assim não fazendo, não sobreviverei.
Então
incorporo a tal resiliência e, todos os dias, resiliente me vou a aventurar
debaixo deste sol no sentido de alcançar o concílio entre a dor e o meu
existir, buscando harmoniza-los a todo instante, constantemente e
insistentemente. Se a dor é diária e é minha e não havendo como dela desvencilhar-me,
transforma-la ei em elemento do meu caminhar e com ela, lado a lado, sigo a
estrada da vida e, agora, não mais sofrendo, mas somando-se a ela a brisa suave
e fresca que me trás a lembrança doce e saudosa da minha parte que se foi a
habitar o eterno e que, mesmo consternado e triste me deixando, trás a mim um
novo viver, por toda a vida e alegria e flores e sorrisos e amor que dispensou
a todos enquanto por aqui viveu e semeou.
Semeou
a alegria do viver em plenitude. Semeou amor, luz e sorrisos e iluminou os
caminhos por onde passou. Iluminava sua estrada e a estrada de todos que com
ela caminhava. Queria ainda muito mais com ela caminhar, mas o inevitável
separou-nos para que voltássemos ao nosso próprio ser e déssemos asas ao voar natural
e necessário de todo e qualquer. Aquele voar único e último para o nosso plano,
mas que nos remete ao começo de tudo; à origem de todos. É o nosso certo
retorno à nossa casa; o retorno à casa do Pai.
Ela
descansa em Deus e de lá nos olha e sorri. Como sorri! Um sorriso tão alvo e
terno que me desperta e me impulsiona, trazendo-me de volta à vida e alimentando
em mim um novo existir, agora, sem a tua presença aqui.
Roberval
Paulo
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