Escrevi este
meu sonho antes da noite acordar
Um sonho
verde e vermelho mergulhado em sangue e tinta
Recordei a
minha casa numa solidão retinta
A mocidade
chegando pela porta do lembrar
E acordei
quase sem eu, sem já ser eu, que desalento
Assim,
misturando eu comigo, angustiado
Pus a mente
lá distante a buscar os meus lembrados
Tanto fui
longe que perdi meus pensamentos
Desalentado
naveguei no meu sonho acarvonado
Onde deixei
tanto riso e tanto sonho que nem sei
E nos dias já
passados eu com medo cavuquei
O medo de
perder o que nunca foi achado
Busquei o
velho baú da mente dos meus guardados
Afugentei a
poeira libertando a memória
E a caneta na
mão e a mão e os olhos na história
Comecei a
estradar a estrada do meu passado
No horizonte
à distância do olhar, tudo ofuscado
Um verde
desbotado se via lá no fim do mar
E era tanta
légua e água o meu sonho a matizar
Que os meus
olhos, meu caminho fez-se todo "enlagrimado"
Retornando ao
começo da origem originada
Onde a
saudosa saudade fez parar a consciência
Vi o terreiro
e os laranjais no quintal da inocência
A rede
embalançando uma paisagem aurorada
Disanuviando
a nuvem que encobria minha lembrança
Disseminando
o pensamento para além da serrania
Na nascente
da tristeza eu vi brotar a alegria
E no verde
ensangüentado descortinou a esperança
Rememorei
tanta vida que eu vivi e nem lembrava
De minha mãe,
seu riso terno e a máquina de costura
Noite adentro
a costurar. De meu pai a formosura
A postura e a
firmeza que minh’alma acalentava
E já outros
dormidos no meu sonho perpassava
Na estrada o
meu avô e o seu canto boiadeiro
O meu pai, a
minha mãe e eu menino no terreiro
Perseguindo
as borboletas, fazendo aquela algazarra
E os meus
irmãos na caminhada a caminho da ribeira
Saltitantes,
só meninos nas meninices da vida
Vagueando com
os vagalumes à luz da fonte garrida
Borboleteando
ao vento uma ciranda alvissareira
O rio da
minha infância que aguacento me abraçava
E me
espraiava em sua praia de areia algodoada
E me cantava
as cantigas com sua voz aveludada
Rumorejando e
levando meu ser que desabrochava
Era uma tarde
de chuva, o horizonte escurecia
E a enxurrada
na rua, cautelosa escorregava
E foi levando
o meu tudo e fiquei só eu e o nada
E no espelho
da memória desencantou a fantasia
Era ainda uma
tarde nebulosa e atormentada
E o meu
sonho, esfriado, noite adentro viajava
E a encontrar
o inevitável todo o meu ser caminhava
E aquela
ponte intransponível outra vez fechava a estrada
Ah! Se eu
tivesse asas. Se as tivesse, eu voava
E no
assombroso vazio do espaço eu reluzia
E todas as
minhas noites eu clareava com dias
Para acordar
o meu sonho em manhã ensolarada
Ficou desse
tempo a dor de não poder nele voltar
Revive a alma
a alegria cada recorte lembrado
As lágrimas
caem do sonho p’ro real imaginado
E a rede
embala o homem desse menino luar.
Roberval Paulo
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