O som ensurdecedor do trovão ressoou na
imensidão azul do céu plúmbeo de medo. E o relâmpago, em raio eletrizante e
cintilante, escorreu deslizante na abóbada em mistério anunciada, se perdendo
no negro azulado da distância. A atmosfera cerrou as portas e o céu abriu suas
comportas, inundando impetuosamente a noite em torrentes de terror e desespero.
Escuridão era o que havia. Escuridão de uma noite sem luz e sem lua. De estrelas
ausentes, apagadas no imaginar do escuro e de sonhos preocupados na inocente
perspectiva de ver ali o mundo acabar.
A profecia se cumpria sem preparo e sem
cerimônia. O fim chegava desavisado e não mais havia tempo nem mesmo pra falar de amor. Gritos se
ouviam em todas as direções. Gritos de desespero e de impotência frente ao
fenomenal evento. Uma desordem geral ordenou no mesmo ambiente e espaço todos
os seres, revelando uma harmonia inexistente nos tempos da normalidade. Homens
e mulheres se juntavam a leões e outros mais bichos, sem se incomodarem.
Crianças escalavam dragões e serpentes, na inocência incomum de ambos, sem
perigo algum. O ondular das ondas feria o espaço vazio com sua lâmina líquida e
aterrorizante, vencendo quaisquer obstáculos, seja de gente, bicho ou outra
qualquer natureza, se arremessando ferozmente sobre tudo, devorando sonhos,
pensamentos, vidas e histórias, sendo história viajante em viagem de céu.
Volumoso corpo aguacento, vivo e adjacente, num surdo rumor de riso e raiva,
subindo vertiginosamente pela estrada aberta e larga que só se estreita nos limites
dos céus. A natureza fechou seus olhos e se entregou, caindo por terra que nem
terra mais é, levantando desta todos os filhos da luz ou trevas, levados
igualmente e impiedosamente ao destino da viagem última. Consumado está o que
não mais se pode remediar. O que foi é o que é e o que é pode ser o que não
será.
O surpreendente de tudo, de todo este
imensionável evento é que, mesmo no fim, a vida não acabava. A vida, quando
chega ao fim, ainda é, em si, um ser existente. Ela se renova, transfigura-se e
habita galáxias desconhecidas da terra a tão largos anos luz distantes, pelo
espaço de um instante. E galáxias e outras mais galáxias se encheram de vida.
Da vida que a terra renegou por não mais suportar. Se encheram da vida que não
mais podiam aqui continuar, mas, que não estavam prontas, aperfeiçoadas para ao
destino final e último chegar. E assim, vão por aí, habitando galáxias e mais
galáxias até atingirem o último estágio da existência. Morrendo e recomeçando,
em nova vida inserida, desconhecida de todos a nova vida investida, mas que é o
caminhar lento, cortante e necessário para o aperfeiçoamento total enquanto
ser, enquanto ser existente vindos do amor maior, vindos do seio do seu
criador, por amor, e que se desvirtuaram por pouco quererem entender do amor
que os trouxe à existência.
E então, penalizados estão, sentenciados a
habitarem, de vida em vida, o desconhecido, até se conhecerem e se entenderem
enquanto seres de amor que são, e, assim, alcançarem, pelo dom do amor, pelo
dom do saber amar, o reino prometido lá no seio daquele que um dia por aqui
caminhou e plantou com todas as letras e com o adubo da verdade, a razão da sua
vinda e sacrifício. Lá no seio daquele que, se dirigindo a todos,
indistintamente e indiscriminadamente, disse em tom de sabedoria e de
santificação, a verdade maior: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém
vai ao pai senão por mim”.
Roberval Paulo
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